“Meu pai trabalhava a semana toda, mexia com lavoura, e minha mãe
ajudava ele a trabaiar. (...) Eu, com sete anos, tomava conta de três irmãos.
Roupa eu não lavava porque não dava conta. Buscava água de tina. Fazia a
comida. Dava banho nos meninos. Buscava fubá numa fazenda lá perto.
Fubá de moinho. Arrumava a casa toda. Minha mãe ficava feliz”. (Antônia)
Antônia conta que na região todos comentavam que ela era uma menina
“trabaiadeira” e isso atraiu até sua casa um fazendeiro de Sete Lagoas que a convidou
para ir embora com ele. De acordo com suas memórias:
“Aí bateu na porta. Eu abri e era uma pessoa de Sete lagoas. (…) Aí ele falou
assim: você dá seu nome???? pros outros? Dou. Sua mãe está em casa?
Minha mãe tá trabaiando, só a noite que ela tá em casa. Aí ele falou assim:
“Ocê quer ir embora com a gente? Eu tô procurando uma menina daqui pra
morar comigo em casa, ficar lá, tomando conta, pra ser babá. Aí eu pensei
na minha mãe.. longe da minha mãe não vai dar. Aí ele falou assim: Eu te
dou tudo: sapato, roupa, escola. Aí, quando foi a noite, ele veio e falou com
minha mãe. Aí minha mãe falou assim: “Óia! Essa menina é trabaiadeira, ela
é responsável, ela que cuida dos meninos pra mim, pra eu poder trabaiar”.
Aí, já tinha o juiz de paz lá da minha cidade, um tal de Augusto Ribeiro, que
era o juíz de paz que tinha naquele tempo, e aí esse homem tava ajeitando
tudo pra me tomar da minha mãe. [choro]. Aí, eu não sabia não. Como
minha mãe era separada / viúva eles tomavam os meninos da mãe, uns
fugiam, outros iam embora, mas eu não tive como escapar…Eles
aumentaram minha idade. Eu tinha dez anos, eles pôs doze. Pra mim foi a
maior tristeza do mundo. Porque eles me tiraram da minha mãe e eu nunca
mais vi ela”. [choro]. (Antônia)
Relata que o que aconteceu na casa dessas pessoas foi bem diferente do que
foi prometido, “(...) eu não gostava de ficar com esse pessoal porque eles eram ruins
demais, eles só me dava comida, roupa e mais nada”. A situação de Antônia reflete a
de muitas outras crianças filhas das classes populares, que, espalhadas pelo Brasil, são
privadas do convívio familiar e levadas a realizar todo tipo de trabalho. Enquanto
“morava” com a família de fazendeiros em Sete Lagoas, ela chegou a ser matriculada
em uma escola, mas disse que não conseguia aprender e nem se concentrar nas aulas,
devido a separação dos pais e por causa do cansaço diário impingido pelo trabalho
doméstico. Esse acontecimento acarretou em sua vida uma série de sofrimentos e
traumas, inclusive, ela relaciona esse fato ao motivo de não ter conseguido se
concentrar na escola e não ter conseguido se alfabetizar, segundo Antônia: