ARTIGO ORIGINAL

 

MUSCULAÇÃO E CONTROLE DA ANSIEDADE EM ADULTOS

 

 BODYBUILDING AND ANXIETY CONTROL IN ADULTS

 

MUSCULACIÓN Y CONTROL DE LA ANSIEDAD EN ADULTOS

 

 Juliana Martins Silvério de Souza Descrição: download Descrição: Lattes

Universidade Estadual de Montes Claros, Januária (MG), Brasil

E-mail: Julianamart019@gmail.com

 

Daniel Venâncio de Oliveira Amaral Descrição: download Descrição: Lattes

Universidade Estadual de Montes Claros, Januária (MG), Brasil

E-mail: dvoamaral@gmail.com

 

Data de Submissão: 02/12/2023 - Data de Publicação: 14/08/2024

Como citar: SOUZA, J. M. S.; AMARAL, D. V. O. Musculação e controle da ansiedade em adultos.  Revista Eletrônica Nacional de Educação Física - RENEF, v. 15, n. 24, dez. 2024. https://doi.org/10.46551/rn2024152300098

 

RESUMO

Os sintomas ansiosos estão presentes, em algum momento, na vida dos indivíduos, podendo ser observados em situações de dificuldade, insegurança, preocupação, ou ainda medo. É uma indicação, dentro da normalidade, posto que funciona como um sistema de alerta do nosso corpo. Nada obstante, quando os sintomas ansiosos se prolongam e se intensificam, afetando a produtividade e a vida cotidiana, tornam-se uma doença. Nessa direção, a atividade física, ao lado da farmacoterapia e a psicoterapia, é considerada um dos mais efetivos métodos para reduzir a ansiedade. O presente artigo descreve e interpreta os vínculos causais existentes entre a musculação e o controle de ansiedade em adultos do sexo masculino e feminino, tendo como referência a análise de dois grupos, totalizando 40 participantes, divididos igualmente no grupo de praticantes, frequentadores de duas academias instaladas na cidade de Januária, Norte de Minas Gerais, e no grupo controle, isto é, não praticantes residentes nesta mesma cidade. Trata-se de um estudo descritivo, quantitativo e de corte transversal, cujos desideratos informativos foram subsidiados pelo questionário “Inventário de Ansiedade de Beck (BAI)”, composto por 21 questões de múltipla escolha. Para associação das variáveis utilizou-se o teste não paramétrico Qui-Quadrado (p<0,05). Os resultados apontam, em linhas gerais, que o grupo de praticantes de musculação apresentou níveis menores de ansiedade quando comparados com os não praticantes. Em outra frente, nas análises específicas dos sexos masculino e feminino, as instâncias de correlações entre os benefícios da musculação e a ansiedade, se fizeram mais presentes entre os homens, ficando as mulheres com vínculos de correlações menos perceptíveis.

Palavras-chaves: Ansiedade. Atividade Física. Musculação. Academias.

 

ABSTRACT

Anxious symptoms are present, at some point, in the lives of individuals, and can be observed in situations of difficulty, insecurity, worry, or even fear. It is an indication, within normal limits, as it works as an alert system for our body. However, when anxious symptoms prolong and intensify, affecting productivity and daily life, they become an illness. In this sense, physical activity, alongside pharmacotherapy and psychotherapy, is considered one of the most effective methods for reducing anxiety. This article describes and interprets the causal links between bodybuilding and anxiety control in male and female adults, taking as a reference the analysis of two groups, totaling 40 participants, divided equally into the group of practitioners, attending two gyms installed in the city of Januária, North of Minas Gerais, and in the control group, that is, non-practitioners residing in this same city. This is a descriptive, quantitative and cross-sectional study, whose informative desiderata were supported by the “Beck Anxiety Inventory (BAI)” questionnaire, composed of 21 (twenty-one) multiple-choice questions. To associate variables, the non-parametric Chi-Square test (p<0.05) was used. The results indicate, in general terms, that the group of bodybuilders had lower levels of anxiety when compared to non-practitioners. On another front, in the specific analyzes of males and females, instances of correlations between the benefits of bodybuilding and anxiety were more present among men, with women having less noticeable correlations.

Key words: Anxiety. Physical activity. Bodybuilding. Gyms.

 

RESUMEN

Los síntomas ansiosos están presentes, en algún momento, en la vida de los individuos, y pueden observarse en situaciones de dificultad, inseguridad, preocupación o incluso miedo. Es una indicación, dentro de lo normal, ya que funciona como un sistema de alerta de nuestro organismo. Sin embargo, cuando los síntomas ansiosos se prolongan e intensifican, afectando la productividad y la vida diaria, se convierten en una enfermedad. En este sentido, la actividad física, junto con la farmacoterapia y la psicoterapia, se considera uno de los métodos más eficaces para reducir la ansiedad. Este artículo describe e interpreta los vínculos causales entre el culturismo y el control de la ansiedad en adultos masculinos y femeninos, tomando como referencia el análisis de dos grupos, con un total de 40 participantes, divididos equitativamente en el grupo de practicantes, que asisten a dos gimnasios instalados en la ciudad de Januária. , Norte de Minas Gerais, y en el grupo de control, es decir, no practicantes residentes en esta misma ciudad. Se trata de un estudio descriptivo, cuantitativo y transversal, cuyos deseos informativos fueron sustentados en el cuestionario “Beck Anxiety Inventory (BAI)”, compuesto por 21 (veintiuna) preguntas de opción múltiple. Para asociar variables se utilizó la prueba no paramétrica Chi-Cuadrado (p<0,05). Los resultados indican, en términos generales, que el grupo de culturistas presentó menores niveles de ansiedad en comparación con los no practicantes. Por otro lado, en los análisis específicos de hombres y mujeres, los casos de correlaciones entre los beneficios del culturismo y la ansiedad estuvieron más presentes entre los hombres, mientras que las mujeres tuvieron correlaciones menos notables.

Palabras clave: Ansiedad. Actividad física. Culturismo. Gimnasios.

 

INTRODUÇÃO

 

A ansiedade é entendida como uma função natural do organismo, preparando-o para responder a uma situação nova e desconhecida, ou mesmo uma situação interpretada como perigosa. Nada obstante, quando atinge graus muito elevados e contínuos, torna-se prejudicial ao organismo, fazendo com que este permaneça em constante estado de alerta, configurando, assim, uma situação patológica (Silva, 2010).  Nessa esteira, Ross (2003, p. 461) afirma que a ansiedade pode ser definida como “um estado subjetivo, desagradável e inquieto de tensão e apreensão, no qual é difícil relaxar ou encontrar calma e paz”.

O estado de alerta em níveis elevados pode evoluir para tensão, insônia, exaustão, aumento da frequência respiratória, dispneia, ataque de pânico, elevação da velocidade do batimento cardíaco, palpitações, ou ainda, o aumento do tônus muscular, que pode gerar processos de dores e tremores musculares (Ross, 2003).

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), mais precisamente o Relatório The Burden of Mental Disorders in the Region of the Americas (2019), a ansiedade é entendida como a segunda condição mental (depois da depressão), com maior incidência de incapacidade dos 36 países analisados, sendo o Brasil a nação com o maior contingente de pessoas afetadas, ou seja, 7,5% da população nacional convive com o transtorno. Estes números são ainda mais alarmantes, visto que, no Relatório World Mental Health Report, produzido em 2022, pela mesma OMS, depressão e ansiedade, apenas no primeiro ano da pandemia, aumentaram, aproximadamente, 25%.

Os dois componentes principais do tratamento dos transtornos de ansiedade correspondem, de forma isolada ou associados, o emprego de medicamentos em médio e longo prazo e a psicoterapia cognitivo-comportamental (Associação Brasileira de Psiquiatria, 2008). A farmacoterapia muitas vezes é necessária, principalmente na fase aguda, para ajudar na estabilização emocional, tornando o agente envolvido mais receptivo para outras formas de tratamento, como a psicoterapia (Lima, et. al., 2021). Esta última, por sua vez, consiste em provocar uma mudança na forma de perceber e raciocinar sobre o ambiente, mais detalhadamente, sobre o que causa a ansiedade (terapia cognitiva) e mudanças no comportamento ansioso (terapia comportamental) (Castilho, 2000).

Paralelamente às duas terapias citadas acima, têm sido sugeridas outras formas de tratamento, com efeitos similares, dentre elas, a prática de exercício físico (Naci; Ioannidis, 2013). O exercício físico libera no cérebro substâncias que proporcionam uma sensação de paz e tranquilidade, a exemplo de endorfinas e neuromediadores ligados à génese do bem-estar e do prazer (Luwisch, 2007). Segundo McAuley e Rudolph (1995), práticas corporais contribuem para integridade cérebro vascular, o aumento no transporte de oxigênio para o cérebro, a síntese e a degradação de neurotransmissores, a diminuição da pressão arterial, dos níveis de colesterol e triglicérides, a inibição de agregação plaquetária, bem como o aumento da capacidade funcional. E consequentemente, a melhora na qualidade de vida.

 A atividade física é considerada um dos mais efetivos métodos para reduzir a ansiedade. Quando o ser humano está ansioso, entra em luta consigo para ativar uma onda constante de adrenalina como resposta a ameaça que se torna excessiva. É neste cenário que o exercício físico pode atuar como uma espécie de “escape natural” ao corpo humano (Cruz, et al., 2013).

A musculação é um agente auxiliar no estímulo da produção de hormônios diretos e indiretamente associados aos níveis de humor. Conforme Arcos, et al (2014), a prática de musculação, além da melhora das condições físicas, associa-se aos aspectos ligados ao bem-estar e autoestima. Desse modo, entende-se que a musculação, ao receber estimulo, implica na parte hormonal, que promove um funcionamento mais adequado. Logo, influencia na forma como o indivíduo lida a vida cotidiana, à medida que a torna mais prazerosa.

Nessa direção, tomando como objeto de análise a cidade de Januária, situada no Norte mineiro, este estudo tem por objetivo investigar se a prática da musculação oferece, de fato, benefícios para seus praticantes, avaliando ainda, em outra frente, se esses benefícios estão mais perceptíveis no público do sexo masculino ou feminino.

A pesquisa ora em tela se justifica pela necessidade de investigar em que medida a prática do exercício resistido pode oferecer benefícios relevantes nos sintomas de ansiedade. Nesses termos, partindo desse pressuposto, torna-se possível, em alguma medida, oferecer subsídios informacionais para academias, profissionais da Educação Física, praticantes e não praticantes de musculação, sobre os benefícios da temática na construção e conscientização da saúde e qualidade de vida de todos.          

 


MATERIAIS E MÉTODOS

O presente estudo trata-se de uma pesquisa descritiva, de corte transversal e de caráter quantitativo. Fizeram parte da amostra 40 participantes divididos, igualmente, em dois grupos, sendo todos escolhidos de forma aleatória. O primeiro grupo de amostragem constituiu-se de 20 alunos, de ambos os sexos, com idades entre 20 e 54 anos, matriculados e regularmente ativos nos últimos três meses em duas academias de musculação situadas na cidade de Januária. Já, o segundo grupo de amostragem, denominado grupo controle, foi composto por 20 pessoas com características gerais semelhantes do primeiro grupo, ou seja, residentes em Januária, de ambos os sexos e com idades entre 20 e 54 anos, porém com uma especificidade, não praticantes de musculação, seja na academia ou em outros espaços.

Inicialmente foi feito o contato com os proprietários das academias para explicar o objetivo, a metodologia da pesquisa e apresentar o Termo de Concordância da Instituição (TCI) para participação no estudo. Posteriormente, em posse da autorização, foi feito o contato com os praticantes de musculação que se encaixaram no grupo de amostra, entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para assinatura e, na sequência, aplicado o questionário presencialmente. Em seguida, foi feito a procura das pessoas não praticantes de atividade física, de forma aleatória e em ambientes públicos, promovendo o mesmo movimento do grupo anterior, isto é, entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para assinatura e, na sequência, aplicado o questionário presencialmente.

Os critérios de inclusão para os participantes da pesquisa funcionaram da seguinte forma: para o primeiro grupo, foram incluídos todos os praticantes de musculação das duas academias selecionadas, que tinham entre 20 e 54 anos, matriculados e regularmente ativos há pelo menos 3 meses consecutivos, e que aceitaram participar de forma voluntária da pesquisa. Para o segundo grupo, denominado grupo controle, foram incluídos os adultos que não praticavam nenhum tipo de exercício físico, que tinham entre 20 e 54 anos e que também aceitarem participar de forma voluntária da pesquisa. Como critério de exclusão de ambos os grupos, foram excluídos aqueles que se recusaram assinar o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) e/ou não responderam completamente o questionário.

Como instrumento de pesquisa, foi utilizado, para avaliação dos níveis de ansiedade, o questionário “Inventário de Ansiedade de Beck- BAI” (Beck; Steer, 1993). Tal inventário, adaptado e padronizado para o Brasil por Cunha (2001), avalia sintomas de ansiedade numa escala de 0 a 4 pontos, que identificam níveis de gravidade crescente de cada sintoma (Tavares, et al., 2012). O inventário é composto por 21 questões de múltipla escolha, que abordam itens relacionados a sintomas ansiosos, como sensação de medo, inquietação, tensão muscular, preocupação excessiva e irritabilidade.

 Para cada questão o indivíduo deve escolher um dentre 4 níveis de ansiedade, sendo as opções de resposta: absolutamente não, levemente, moderadamente ou gravemente. A soma dos escores obtidos pode variar de 0 a 63 pontos. Um escore total de até 7 pontos indica grau mínimo de ansiedade; um escore variando entre 8 e 15 pontos indica uma ansiedade leve; entre 16 e 25 pontos, uma ansiedade moderada; e, entre 26 e 63 pontos, uma ansiedade grave. A aplicação do questionário foi acompanhada por um psicólogo.

Os dados coletados foram planilhados e realizada uma estatística descritiva por método de porcentagem. Para associação das variáveis utilizou-se o teste não paramétrico Qui-Quadrado (p<0,05). As análises foram feitas com o pacote estatístico Statistical Package for the Social Science (SPSS), versão 22.0.

No decorrer da pesquisa, respeitou-se o aspecto ético, observando-se as recomendações da Resolução número 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, que trata das diretrizes e normas que regulamentam pesquisas que envolvem seres humanos. Desse modo, o número do Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAEE) é 70666923.1.0000.5146 e teve sua aprovação datada do dia 23 de julho de 2023.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

          Conforme é possível depreender dos dados cotejados na pesquisa, o grupo de não praticantes de musculação apresentou taxas mais elevadas de ansiedade quando comparado com o grupo de praticantes. De forma geral, apenas 5 (25%) da amostra que frequenta academia foi classificada com níveis de ansiedade que apresentam algum prejuízo à saúde, a saber, ansiedade leve, moderada e grave. Por outro lado, os não praticantes de musculação, também denominado grupo controle, foi responsável por 14 (70%) dos registros de ansiedade com diferentes graus de prejuízo, sendo ainda encontrados, neste grupo, níveis de ansiedade grave, o que não foi encontrado no primeiro grupo.

          De forma mais detalhada, 15 (75%) frequentadores de academia foram classificados com grau mínimo de ansiedade, ou seja, normal ao ser humano, por outro lado, 3 (15%) deste mesmo grupo revelou um quadro de ansiedade leve, outros 2 (10%) ansiedade moderada e nenhum registro foi classificado no escopo de ansiedade grave. Já, no grupo controle, constatou-se que 6 (30%) enquadrou-se no grau mínimo de ansiedade, somando-se, ainda, 9 (45%) com ansiedade leve, 2 (10%) com ansiedade moderada e 3 (15%) com ansiedade grave (Tabela 1 e 2).

Tabela 1: Classificação do nível de ansiedade intergrupos de praticantes musculação.

Grupo

Sexo

 

Nível de Ansiedade

Total

X2

 

 

Grau Mínimo

Leve

Moderada

Grave

 

 

 

 

FA

FR(%)

FA

FR(%)

FA

FR(%)

FA

FR(%)

 

 

Praticantes

Masculino

8

40

1

5

1

5

0

0

 

0,001

 

Feminino

7

35

2

10

1

5

0

0

 

 

Total

 

15

75

3

15

2

10

0

0

100%

 

Fonte: Próprio autor.                                                                            FA = Frequência Absoluta

                                                                                                          FR = Frequência Relativa

 

Tabela 2: Classificação do nível de ansiedade intergrupos de não praticantes musculação.

Grupo

Sexo

 

Nível de Ansiedade

 

X2

 

 

Grau Mínimo

Leve

Moderada

Grave

 

 

 

 

FA

FR(%)

FA

FR(%)

FA

FR(%)

FA

FR(%)

 

 

Não Praticantes

Masculino

5

25

5

25

0

0

0

0

 

0,11

 

Feminino

1

5

4

20

2

10

3

15

 

 

Total

 

6

30

9

45

2

10

3

15

100%

 

Fonte: Próprio autor.                                                                            FA = Frequência Absoluta

                                                                                                          FR = Frequência Relativa

Outro ponto instigante revelado pela pesquisa diz respeito a diferença da incidência dos sintomas de ansiedade entre homens e mulheres. No caso do grupo de praticantes de musculação, foi possível inferir que 2 participantes (10%) do sexo masculino apresentou graus de ansiedade entre leve e moderado, ao passo que, a amostra do sexo feminino, o número obtido foi 3 (15%). Utilizando o teste não paramétrico Qui-quadrado, tendo como foco o grupo de praticantes, na comparação entre ambos os sexos, observou-se uma diferença significativa nos resultados (p-0,001). Essa diferença parece ocorrer em razão do público masculino apresentar uma maior classificação no grau que não apresenta riscos à saúde, e 5% a menos no grau leve de ansiedade comparado ao sexo feminino.

 Na mesma direção, ao avaliar o grupo de não praticantes, constatou-se que não houve diferença significativa no teste não paramétrico Qui-quadrado (p-0,11). No entanto, em que pese uma relativa normalidade comparativa entre os dois sexos, é notório que as mulheres apresentaram uma incidência ansiosa mais agravante, isto é, 45%, enquanto no caso dos homens, por outro lado, obteve-se um índice de 25%.

Segundo Kessler, et. al. (1994), em estudo da situação epidemiológica da “população geral” dos Estados Unidos, na reunião dos dados avaliados, foi constatado que as mulheres apresentam maiores propensões para o desenvolvimento de transtornos de ansiedade ao longo da vida. Nessa mesma esteira, Kendler et. al. (1995), analisando especificamente o estado da Virginia, EUA, corroborando com o argumento citado acima, apontam para um maior recorrência e agravamento das comorbidades psiquiátricas no público feminino. Em outro estudo, Kendler, et. al. (1997) sugerem ainda que os fatores genéticos, em contraste com os ambientais, podem desempenhar um papel no desenvolvimento de transtornos de ansiedade.

          Uma possível explicação para os transtornos mentais comuns predominarem nas mulheres se deve, conforme apontado por Souza, et. al. (2017), situações adversas como dupla jornada de trabalho, baixos salários e aspectos relacionados à reprodução, pois a mulher que vivencia o trabalho e o encargo familiar, geralmente, renuncia ao próprio cuidado para dedicar-se ao próximo, culminando em quadros de consternação, ansiedade, frustração, angústia, adoecimento e, sobretudo, ocorrência de transtornos mentais. Outra possível explicação é o fato de as mulheres, nas palavras de Morais e Segri (2011, p. 145), “se abrirem mais e terem maior consciência ou estarem mais voltadas para seus estados internos do que os homens”.

          No recorte avaliado da cidade de Januária, tendo como referência as tabelas 3 e 4, que exibem a frequência absoluta e relativa dos sexos masculino e feminino, dos grupos de praticantes e não praticantes, constatou-se, em síntese, utilizando o teste não paramétrico Qui-quadrado, que na comparação entre o público masculino ocorreu uma diferença significativa no quadro ansioso, mais precisamente (p= 0,004). Já, no público feminino, diferentemente, realizando a mesma comparação entre aquelas presentes nos dois grupos (praticantes e não praticantes), não houve diferença significativa, quer seja, (p= 0,308).

Tabela 3:  Classificação do nível de ansiedade entre grupos de praticantes e não praticantes de musculação masculino.

Sexo

Grupo

Nível de Ansiedade

X2

 

 

 

Grau Mínimo

Leve

Moderada

Grave

 

 

 

 

FA

FR (%)

F A

FR(%)

FA

FR(%)

FA

FR(%)

 

 

Masculino

Praticantes

8

40

1

5

1

5

0

0

0,004

 

 

Não Praticantes

5

25

5

25

0

0

0

0

 

 

Total

 

13

65

6

30

1

5

0

0

 

 

Fonte: Próprio autor.                                                                            FA = Frequência Absoluta

                                                                                                          FR = Frequência Relativa

 

Tabela 4:  Classificação do nível de ansiedade entre grupos de praticantes e não praticantes de musculação feminino.

Sexo

Grupo

Nível de Ansiedade

X2

 

 

Grau Mínimo

Leve

Moderada

Grave

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

FA

FR (%)

FA

FR(%)

FA

FR(%)

FA

FR(%)

 

Feminino

Praticantes

7

35

2

10

1

5

0

0

0,308

 

Não Praticantes

1

5

4

20

2

10

3

15

 

Total

 

8

40

6

30

3

15

3

15

 

Fonte: Próprio autor.                                                                           FA = Frequência Absoluta

                                                                                                          FR = Frequência Relativa

 

Observando as tabelas de forma mais detalhada, percebe-se uma relação de maior favorecimento dos homens com a musculação, posto que o grupo de praticantes apresentou maior incidência de grau mínimo de ansiedade (40%), quando comparado com o grupo de não praticantes (25%). Além disso, o primeiro grupo apresentou 5% de ansiedade leve, tendo o grupo controle apresentado 25%, ou seja, um valor 20% maior. Já no que diz respeito as mulheres, em que pese não haver diferença significativa entre praticantes e não praticantes, seria um excesso de nossa parte afirmar que a musculação não apresenta benefícios para este público. Uma evidência a esse respeito, pode ser explicitada na comparação das médias de ansiedade moderada e grave, sendo observado, nas mulheres praticantes, 15% entre ansiedade leve e moderada, e 0% de ansiedade grave. Esta mesma avaliação, nas mulheres não praticantes, apresentou um resultado mais preocupante: 30% entre ansiedade leve e moderada, e 15% de ansiedade grave. 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O conjunto de dados arrolados neste curto recorte nos permite constatar, em linhas gerais, que no bojo dos dois grupos avaliados na pesquisa, quer seja, os praticantes de musculação e os não praticantes, observou-se menores níveis de ansiedade em favor do primeiro grupo. De forma mais detalhada, a prática da musculação apresentou maior incidência de benefícios, para o controle da ansiedade, entre os praticantes do sexo masculino, quando comparado com os não praticantes.

Em outra frente, no que tange ao sexo feminino, não foi possível observar, de forma clara, essas mesmas instâncias de correlações. Isso não significa dizer que a musculação não apresenta benefícios para este grupo, posto que entre as mulheres praticantes de musculação os índices de ansiedade de níveis mais graves foram menos recorrentes, quando confrontados com os mesmos resultados do público feminino não praticante. Com efeito, outras variáveis que podem, de alguma maneira, explicar essa diferença de resultados entre os dois sexos, fugiram aos desideratos da pesquisa, sendo objeto de análise em outra oportunidade.

 

REFERÊNCIAS

 

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