REVISTA NORTE MINEIRA DE ENFERMAGEM
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INTRODUÇÃO
A segurança do paciente tem sido
o tema central de discussões na área da saúde em quase todas as partes do
mundo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem enunciado vários desafios e
diretrizes nesta área, no sentido de fornecer subsídios para a discussão nos
serviços de saúde, como um ponto de partida para implantar e promover medidas
de segurança do paciente. Esta é compreendida como redução
do risco, a um mínimo aceitável, de danos desnecessários associados ao
atendimento em saúde(1).
Há mais de dez
anos um relatório foi divulgado pelo Instituto de Medicina dos Estados Unidos:
“Errar é humano: construindo um sistema de saúde mais seguro”, no qual se investigou prontuários de 30.121
internações e identificou-se que sérios prejuízos iatrogênicos haviam ocorrido
em 3,7% das internações (6,5% dos quais provocaram disfunções permanente e
13,6% envolveram a morte do paciente(2,3).
Após
a publicação desse relatório,
enfatizou-se a redução urgente de eventos adversos em todo o mundo. Em se tratando
da assistência à saúde nos hospitais brasileiros, supõe-se que os erros e seus
efeitos são notavelmente maiores, visto à fragilidade dos serviços prestados
seja por meio da escassez de profissionais, da carga horária excessiva,
estresse, déficit de recursos materiais e à precária remuneração dos
profissionais(4).
Com o intuito de reduzir os erros e promover práticas mais
seguras, as instituições de saúde estão investindo em ações que primem pela
qualidade assistencial e busquem o desenvolvimento de uma cultura de segurança.
Esta pode ser definida como um conjunto de valores, atitudes, competências e
comportamentos que estabelecem o comprometimento com a gestão de saúde e da
segurança, desviando a culpa e a penalização pela oportunidade de aprender com
os erros e aprimorar a atenção à saúde(5).
No Brasil, foi lançado
em abril de 2013 o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP) e
publicada a Resolução da Diretoria Colegiada número 36/2013, que conferem ações
para a segurança do paciente nos serviços de saúde, tornando-se
obrigatório a nomeação de um Núcleo de Segurança do
Paciente (NSP) em hospitais públicos, privados, filantrópicos, civis ou
militares responsável por desenvolver ações e estratégias para o
desenvolvimento de uma cultura de segurança. O Núcleo propõe, sobretudo,
minimizar a ocorrência de danos e eventos adversos direcionados aos pacientes
que necessitam de cuidados, fornecendo mais qualidade ao serviço prestado e
incentivando as notificações dos eventos adversos. O NSP deve ser composto por
uma equipe multidisciplinar comprovadamente capacitada em segurança do paciente
e ou gerência de risco(5).
Neste contexto, para maior segurança do paciente é necessário que
todos os profissionais da saúde estejam familiarizados com essa temática,
enfatizando os enfermeiros. Estes são profissionais de saúde que necessitam de
conhecimento aprofundado e atualizado para prevenir e minimizar complicações
locais e/ou sistêmicas ao paciente, reduzir gastos desnecessários e garantir
uma melhor qualidade ao serviço proporcionado. Além disso, vale ponderar que as
instituições ainda estão aprendendo e se adaptando aos NSP, justamente pela
normatização ser uma proposta relativamente nova. Assim, ainda há poucos
estudos que contribuam com a discussão da atuação do Núcleo na perspectiva de
avanços na prática profissional e redução de danos ao paciente.
No âmbito internacional, as discussões envolvem estratégias e
mecanismos envolvendo a equipe multiprofissional, que vem sendo desenvolvidos
para reduzir os eventos adversos e melhorar a segurança do paciente nas
instituições de saúde, como mecanismos para reduzir quedas e lesões em
pacientes; favorecer recursos humanos, inclusive aumentar o número de
enfermeiros nas instituições, dentre outros(6-8).
Pensando no papel do enfermeiro
nos NSP, problematizado em relação ao alcance de práticas seguras, em uma
disciplina teórico-prática “Gerência em Enfermagem” de um curso de graduação em
Enfermagem de uma universidade pública, surgiu a questão central deste
estudo: Como o NSP atua para alcançar e desenvolver a segurança do paciente na perspectiva desses profissionais?
Acredita-se que estudos desta natureza são relevantes, pois apoiam a redução
das lacunas do conhecimento em relação a segurança do paciente e têm potência
para contribuir com a
disseminação desta cultura nas instituições de saúde. Diante do exposto,
objetivou-se compreender a atuação do Núcleo de Segurança do Paciente sob a
ótica dos membros enfermeiros.
MÉTODOS
Este estudo é parte de um projeto maior, da equipe de
pesquisadores, intitulado “Estratégias para alcançar as ações da política
nacional de Segurança do paciente em hospitais de ensino”. Trata-se de um
estudo de caso qualitativo, que tem como foco a análise de uma unidade social,
buscando entender os fenômenos sociais complexos e responder “como” e “por que”
eles ocorrem. Esse método de pesquisa foi escolhido, pois permite o pesquisador
captar características significativas presentes em contexto real(9).
Portanto, a escolha teórica metodológica atende a compreensão do fenômeno
estudado que se refere a atuação de um NSP de um hospital de ensino sob o olhar
do enfermeiro.
O
cenário de pesquisa foi um hospital de ensino, localizado
na Zona da Mata de Minas Gerais, escolhido por se tratar de um local de
referência com atendimento de alta complexidade. Trata-se de uma instituição
que possui serviço de
Nefrologia, Hemodinâmica, Urgência e Emergência, Centro de Tratamento Intensivo
adulto. Oferece serviço de internação e de Pronto Atendimento de urgências e
emergências à população da cidade e a uma microrregião de oito municípios.
A população do estudo foi intencional,
composta por seis enfermeiros que faziam parte do NSP e que supervisionavam os
seguintes setores: Centro de Tratamento Intensivo, Bloco Cirúrgico, Pronto Socorro, Hemodinâmica,
Hemodiálise e Clínica Médica. O NSP deste hospital foi criado em 2013 e é
composto por seis enfermeiros, um farmacêutico, dois administradores e um
nutricionista.
Os critérios de inclusão foram: ser
enfermeiro, ser membro efetivo do NSP e tempo mínimo de vínculo na
instituição de um ano. O critério de exclusão foi estar
afastado do cargo por qualquer motivo. A escolha por estes participantes
enfermeiros foi pelo interesse de compreender o núcleo sob a ótica desse
profissional, que tem em seu percurso formativo o gerenciamento de serviço de
saúde e a assistência direta ao paciente.
A coleta de dados foi realizada de maio a
junho de 2016 por meio de entrevistas, com roteiro semiestruturado, previamente
elaborado pelo pesquisador. Foi realizado teste piloto com dois enfermeiros, de
outra instituição hospitalar, sem necessidade de alterações e seus conteúdos
não foram utilizados na pesquisa. As questões abordadas foram: conceitue com
suas palavras o que você entende por Núcleo de Segurança do Paciente; comente
sobre a importância do Núcleo de Segurança do Paciente para a intuição
hospitalar; como ele funciona, suas ações e dificuldades encontradas. As
perguntas fechadas foram referentes à caracterização dos entrevistados. As
entrevistas duraram em média vinte minutos e ocorreram dentro do próprio setor,
em uma sala reservada, agendadas previamente, o que se configurou em um local
favorável para o participante expor com tranquilidade e segurança as suas
vivências. Os depoimentos foram gravados
mediante autorização dos participantes do estudo e posteriormente transcritos na íntegra. Para assegurar o anonimato dos
sujeitos estes foram referenciados utilizando-se a associação da letra E, de
enfermeiro, e o número da entrevista.
Para
análise dos dados, foi realizada a técnica de análise de conteúdo, seguindo as
seguintes fases cronológicas: pré análise, exploração
do material e tratamento dos resultados, inferência e interpretação(10).
Assim, inicialmente foi realizada uma leitura flutuante e exaustiva das
questões das entrevistas, de forma a interagir com o texto e obter uma
compreensão sobre o que o sujeito buscava transmitir. Em seguida procedeu-se a
exploração do material colhido, tornando as informações cada vez mais claras e
apropriadas ao propósito do estudo e por fim, o tratamento dos resultados, onde
o pesquisador procurou torná-los significativos, válidos à pesquisa, analisados
à luz da literatura(10).
Foram elaboradas três categorias de análise, assim denominadas: “A
percepção dos enfermeiros sobre o Núcleo de Segurança do Paciente”; “A
importância do Núcleo de Segurança do Paciente para a instituição” e “Proposta
para avançar na segurança do paciente”.
A
pesquisa foi desenvolvida respeitando os aspectos éticos, conforme a Resolução
466/2012 do Conselho Nacional de Saúde e submetida à apreciação do Comitê de
Ética em Pesquisa com Seres Humanos, com parecer nº 1.512.189. Todos os
participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
RESULTADOS
Os participantes do estudo eram
predominantemente do sexo feminino (83%), a faixa etária encontrada foi de 33 a
46 anos. O tempo de formação variou entre 04 a 21 anos. Todos ocupavam
cargo gerencial, mas todos tinham especialização na área assistencial. O tempo
de exercício profissional no setor atual era de 01 a 17 anos. Foi identificada
escala de trabalho diário de 12 por 36 horas. Apenas um enfermeiro tinha duplo
vínculo empregatício, com um segundo vínculo na área acadêmica. Seguem as
categorias elaboradas a partir da análise dos dados:
A percepção
dos enfermeiros sobre o núcleo de segurança do paciente
Nesta categoria, foi identificado que mesmo na
posição de membros efetivos do NSP, esses profissionais não conheciam muito bem
as suas competências, para atuação efetiva na comissão. No entanto, apesar de não saberem
na íntegra suas atribuições e não apresentarem exposições fundamentadas sobre o
assunto, reconheceram a importância de uma atuação profissional de forma
segura, e a importância de uma atuação de forma a minimizar erros e prevenir
danos, conforme depoimentos:
“O Núcleo é tudo aquilo que proporciona a
segurança ao paciente, busca prevenir todo e qualquer dano ao paciente. Eu não
conheço as normas específicas. Essa questão da segurança do paciente é bem
ampla. Então, acho que envolve muita coisa nisso” (E1).
“O NSP é uma comissão que temos aqui mais
assim, detalhes por detalhes eu não lembro não sinceramente” (E2).
Os depoimentos abordam a preocupação dos participantes
com os riscos assistenciais e com a prestação de um cuidado com qualidade. Nos
depoimentos, identifica-se a compreensão dos profissionais em prestar cuidados
seguros durante todo o processo da internação clínica do paciente, e
explicitaram medidas estratégicas como a identificação do paciente,
comunicação, medicação e prevenção de quedas, conforme depoimentos:
“Eu
entendo como Núcleo de Segurança do paciente é o Núcleo que prevê o que pode
acontecer com o paciente o que a gente pode prevenir para não acontecer. Às
vezes tem um chão que está escorregando então o Núcleo de Segurança vai reunir
e conversar a respeito daquele piso “[...]”. O Núcleo de segurança é aquilo que
resguarda o paciente [...]” (E4).
“Núcleo! Ah o que eu entendo que tem vários
passos, aí tem a identificação do paciente, a gente vai comunicar com o
paciente o que está sendo feita, a gente vai identificar os medicamentos, zelar
pela segurança do paciente” (E5).
“O
Núcleo funciona, é para a melhoria do atendimento ao paciente” (E3).
“Então,
segurança do paciente para mim é que o paciente entra, por exemplo, para fazer
qualquer procedimento e ele saia com esse problema que ele chegou resolvido,
sem nenhuma intercorrência durante esse período que ele fique aqui dentro.
Então, ele tem que sair melhor do que ele entrou. O núcleo tem que atuar neste
sentido” (E6).
A importância do Núcleo de Segurança do
Paciente para a instituição
Nesta categoria foi abordado o
reconhecimento que os participantes dão ao NSP, como algo positivo para a
instituição, trazendo consigo melhorias e segurança tanto para o profissional
quanto para o paciente. Alguns participantes destacaram a possibilidade da
melhoria da qualidade com a implantação do Núcleo e suas ações, evidenciado
nos depoimentos:
“Sim,
eu acho que a partir do momento que você trabalha com segurança, a sua
qualidade vai melhor né, tanto do paciente e para a gente que trabalha também,
na verdade para os profissionais, todos que atuam aqui dentro” (E6).
“Com certeza! Porque o núcleo vai dar
segurança para aquele paciente, para que não ocorra nenhum problema com
ele”[...] (E3).
“Eu acho que é importante sim, eu acho não,
tenho certeza, o objetivo é de melhorar e não piorar a situação do paciente, se
ele vier para o hospital e já vem com um dano, você causar outro é difícil” (E2).
Alguns participantes expressaram
que a partir da implantação e trabalho do Núcleo, houve progressão com as notificações
de EA na instituição e uma maior conscientização do erro por parte de toda a
equipe. O NSP tem trabalhado dentro de uma perspectiva em corrigir erros e
propor melhorias futuras dentro da segurança do paciente, conforme expressam os
depoimentos:
“É importante a atuação do núcleo e estamos
melhorando. Eu observo assim, através das notificações está tendo melhora
entendeu? Temos que melhorar muito ainda, mas algumas coisas já mudaram [...]” (E1).
“Sim! Uma base para não ter erro de medicação,
erro nenhum ao paciente, eu acho que é muito importante” (E4).
“O paciente dá entrada aqui com um tipo de
patologia e, uma coisa simples que vou citar é a úlcera por pressão. O paciente
entra sem á úlcera e geralmente depois sai com a úlcera, é seguro isso? Não”
(E5).
Na visão dos enfermeiros, o Núcleo
pode contribuir com o desenvolvimento da cultura de segurança do paciente,
melhorando a assistência, auxiliando na identificação e diminuição dos erros.
Assim, destacam o NSP como uma base para direcionar uma prática assistencial
segura, importante em todo processo de tratamento ou reabilitação do paciente.
Foi possível identificar nos depoimentos a citação de algumas metas
internacionais de segurança do paciente, como, a identificação do paciente e o
cuidado com a medicação, no entanto, não mencionaram os protocolos de segurança
ou o plano de ação do NSP.
Propostas para avançar na segurança do
paciente
Esta categoria demonstra a necessidade do
desenvolvimento de treinamentos, pesquisas e educação permanente, na visão dos
participantes, a fim de ser apresentados na íntegra as funções do NSP, o
que não implica, necessariamente, mais recursos da instituição. Trata-se de uma estratégia que precisa ser
desenvolvida não só com os membros do núcleo como para toda a equipe de saúde,
envolvendo principalmente os técnicos de enfermagem que participam de forma
direta no cuidado ao paciente, conforme os depoimentos:
“Eu
acho que é importante ser divulgado, tem que ser estudado em todas as
instituições que trabalham nesta área”. (E3)
“A
instituição deveria, não só aos enfermeiros, mas também os técnicos, ter um
pouco mais de atenção para isso. Desenvolver treinamentos, palestras,
pesquisas, porque assim, nós não temos muito tempo hábeis para fazer educação
continuada, essas coisas, devido até falta também de profissionais. Aqui dentro
é bem tranquilo, mas quando saio aí fora, é bem complicado [...]” (E5).
“Eu
acho que esse tema precisa ser abordado. Acho que hoje a gente precisa é
debater mais sobre esse tema do Núcleo, porque às vezes a gente fica pensando
em uma coisa em longo prazo. Às vezes a segurança do paciente é coisa boba,
coisa pequenininha, dá para a gente fazer, poder assegurar o paciente. Acho que
isso é boa vontade [...]”(E1).
Os depoimentos trouxeram que a instituição
precisa avançar nas questões de segurança do paciente, conceito que precisa ser
compreendido e realizada por todos da equipe, além de ter um profissional
exclusivamente para direcionar o NSP e não compartilhar outras atribuições:
“Este tema está sendo bem
discutido agora. Acho que ele é interessante e tem que bater na tecla mesmo
para ver se implanta. Temos que ter uma pessoa só para fazer esse papel, lá
para frente mesmo” (E2).
Outro avanço expresso no depoimento, é a disponibilidade de
recursos humanos e financeiros para avançar nas estratégias e desenvolver uma
cultura se segurança em todo o hospital:
“Eu
acho que é uma questão tem que batalhar, trabalhar dentro de todo o hospital.
Aqui no hospital, a gente precisa muito de trabalhar isso, mas, às vezes, o que
falta mesmo é o pessoal, mão de obra. É recursos humanos, recursos de dinheiro.
Então, acho que isso tudo a gente precisa para melhorar” (E6).
DISCUSSÃO
De
acordo com os resultados apresentados, percebe-se que faltam os enfermeiros
adquirirem informações necessárias no desenvolvimento de competências a serem
desenvolvidas como integrantes do NSP. O conceito de competência foi
introduzido também nas propostas de formação e atualizações profissionais.
Nesta lógica, competência relaciona-se a uma combinação de Conhecimento,
Habilidade e Atitude, apreendida durante processos educativos e expressa pelo
indivíduo mediante seu comportamento num determinado contexto profissional(11).
Neste caso, no cenário estudado, dentro do contexto da segurança do paciente,
falta o enfermeiro desenvolver saberes e habilidades para sua atuação no
núcleo.
Sobretudo,
é necessário destacar que a estratégia de implantação do Núcleo ainda é algo
novo para as instituições de saúde, o que configura um processo que está em
construção, mas que é extremamente importante a atuação desta comissão para
desenvolver uma cultura de segurança nos serviços de saúde(5,12).
Na
primeira categoria, os resultados apontaram que os profissionais demonstraram dificuldades
em identificar os papéis a serem desempenhados no NSP, mas reconhecem uma
atuação de forma a minimizar erros e prevenir danos. O Núcleo de Segurança do Paciente
é uma estratégia do Ministério da Saúde para atender uma necessidade de
melhorar a segurança do paciente no serviço de saúde. Trata-se de instância do
serviço de saúde que tem como objetivo auxiliar a implementação de ações
voltadas à segurança do paciente, como por exemplo, a implantação e
monitoramento de protocolos(12), mas somente a sua criação não
garante a finalidade maior da sua existência, que é a efetiva segurança do
paciente.
Na
instituição estudada, o Núcleo de Segurança do Paciente foi criado em 2013,
sendo um ato compulsório em todos os serviços de saúde. No entanto, mesmo se
configurando como ato obrigatório à instituição, os profissionais ainda não
estavam contextualizados e cientes das competências a serem desenvolvidas, o
que implica em fragilidades para a sua construção, lacunas do conhecimento e
invisibilidades do Programa de Segurança do Paciente.
Torna-se
fundamental entender a razão da existência de uma comissão institucional e
agregar sentido ao trabalho aos profissionais envolvidos. Dar sentido para
aqueles que o realizam pode orientar as decisões e as intervenções dos
responsáveis no processo de transformação organizacional. Dar sentido para
aquilo que é executado muda a forma de pensar, repensar, buscando realizar um
exercício constante de interrogação do que se executa em suas ações diárias(13).
Avançando
na reflexão sobre a invisibilidade do Programa dentro da instituição estudada,
isso pode refletir direta ou indiretamente na qualidade e segurança do paciente
dentro do hospital, necessitando de corresponsabilidades
da própria administração, líderes e demais profissionais. Os
integrantes do Núcleo de Segurança do Paciente precisam assumir uma postura
proativa, interagindo com os vários setores da instituição e discutindo
possíveis soluções para
os problemas encontrados, mas, para isso, precisam avançar em conhecer mais
sobre as atividades e competências do NSP e seu principal objetivo(14).
Os resultados encontrados demonstram a necessidade de medidas de
atualização das suas competências de um integrante do NSP e como auxiliar no desenvolvimento
de uma cultura de segurança do paciente. Vale ressaltar que o Programa Nacional
de Segurança do Paciente é composto por seis metas internacionais específicas
às quais norteiam os profissionais por meio de protocolos, sendo elas:
Identificação do paciente; comunicação segura, administração de medicamentos;
cirurgia segura; higiene das mãos e prevenção de lesão por pressão e quedas(5,14).
Nos resultados, os profissionais demostraram conhecer e buscar cumprir essas
metas evidenciando uma atuação influenciada pela formação, vivências, dentre
outros aspectos.
Na segunda categoria, os
enfermeiros mencionaram o NSP como algo importante para a instituição, que atua
de forma a impedir que os erros cheguem de forma direta e indireta aos
pacientes. A criação e atuação do NSP proporcionou a identificação de eventos
adversos e um avanço nas notificações, presumindo um decréscimo de erros e
reincidência de casos. A partir do momento que notificações são realizadas, há
uma maior cobrança em fiscalizar situações que rotineiramente, poderiam ficar
invisíveis ao serviço de saúde, seja pelo tecnicismo diário ou pela sobrecarga
de trabalho dos profissionais. A notificação de eventos adversos é realizada por
meio do Sistema Nacional de Notificações para a Vigilância Sanitária
(NOTIVISA), o qual deverá manter o setor e ou a instituição atualizada dos
resultados da análise, encorajando todos profissionais a divulgação de falhas(14).
Notificar deve ser uma preocupação e um dever de toda a equipe de saúde, desde
profissionais a pacientes ou familiares que percebem a falha(15).
A notificação é considerada uma medida preventiva, uma vez que
identifica e investiga o erro, proporcionando a execução de planos de ação e
identificação de causa raiz, treinamentos e evitando reincidência de danos aos
pacientes(5).
A
Organização Mundial de Saúde estima que danos à saúde ocorram em dezenas de
milhares de pessoas todos os anos no mundo, e, no Brasil, estudos mostram que a
incidência de eventos adversos é alta, sendo 66% considerados evitáveis(16).
Cabe ressaltar que evento adverso é o incidente que resulta em danos à saúde.
Tais incidentes causam prejuízos ao paciente, familiares e a todo sistema de
saúde e ocorrem devido às falhas decorrentes de processos ou estruturas da
assistência(5).
Um estudo realizado na Colômbia avaliou relatórios de eventos
adversos em uma instituição de ensino superior no ano de 2011, no qual concluiu
que no total de 353 pacientes que foram admitidos no hospital, 54 tiveram
eventos adversos, dos quais 55% eram por administração de medicamentos(17).
Um
estudo norueguês(6) identificou que as taxas de eventos adversos
diminuíram, em hospitais públicos e privados, após quatro anos de monitorização
dos eventos evitáveis, com campanhas para melhorar a segurança do paciente e
reduzir o dano(6). Em se tratando da realidade brasileira, um estudo
realizado em três hospitais de ensino do Rio de Janeiro no ano de 2013, indicou
uma incidência de eventos adversos de 5,1% com proporção de 66,7% entre os
eventos adversos evitáveis sendo esses responsáveis por 373 dias adicionais dos
pacientes no hospital(18).
Esses
dados remetem à importância de uma atuação ativa do NSP dentro da instituição,
auxiliando os profissionais por meio de estratégias simples e efetivas, prevenindo
e reduzindo riscos e danos aos pacientes, por meio da notificação de eventos
adversos, seguimento de protocolos específicos, estabelecendo plano de ação e
melhorias, tudo com o direcionamento dos membros do NSP(19). A falta de compreensão sobre o erro, sobre a
segurança do paciente ou atribuições do NSP podem acarretar um serviço inseguro
e uma assistência sem qualidade. Por isso, torna-se imprescindível aprofundar o
conhecimento para implantar estratégias de melhorias eficazes para a segurança
do paciente. Neste sentido, propõe-se realizar o planejamento estratégico das
ações, divulgação e avaliação dessas estratégias, com envolvimentos de todos os
profissionais.
Na terceira categoria é identificado, na visão
dos participantes, a necessidade de se implantar medidas para divulgação e
capacitação do NSP para toda equipe de saúde, face a carência de conhecimento
sobre a temática. Necessário se faz reforçar o
enfrentamento das dificuldades do NSP com o intuito de juntos poderem repensar
estratégias eficazes que vão ao encontro das metas internacionais, como a
formulação de protocolos e plano de segurança do paciente, trazendo um cuidado
com qualidade e com redução de erros.
É imprescindível difundir este conhecimento a
todos os setores da instituição, aos técnicos de enfermagem, que demandam
grande parte dos serviços em contato direto com os pacientes, fornecendo
informações, esclarecimentos, tirando dúvidas e receios dos profissionais
quanto à punição de notificação. Salienta-se também incentivar uma boa comunicação
e interação entre os membros da equipe e família, impedindo dupla interpretação
das informações geradas, desde a identificação a qualquer procedimento,
evitando assim, a ocorrência de eventos adversos(5).
Uma
fragilidade identificada nessa categoria foi o fato dos profissionais abordarem
a segurança do paciente como algo em longo prazo, devido a dificuldades de
recursos humanos e financeiros. O NSP não vem com mudanças radicais, e sim,
reforçar transformações mínimas, rotineiras que são obrigações diárias, mas que
infelizmente muitos profissionais, por esperar resultado em longo prazo acabam
menosprezando o básico, proporcionando o erro e omissão na assistência.
Além
disso, nos depoimentos, os profissionais expressaram ser necessário um profissional
responsável exclusivamente pelo NSP. O responsável pelo Núcleo, ou o gerente de
risco, assumia outras responsabilidades como a Comissão de Controle de Infecção
Hospitalar e Gestão da Qualidade.
A
magnitude do erro e dos problemas ocasionados por ele pode ser extenso demais
em comparação a ações mínimas que o NSP prevê. Portanto, enfatiza-se que
instituir grupos educativos, a educação permanente, palestras e outros afins,
capacitando os profissionais periodicamente, impede o desgaste ao sistema de
saúde, aos pacientes e familiares. A educação permanente leva o profissional a
refletir sobre sua prática, entender os processos de trabalho nos quais estão
inseridos, tendo a possibilidade de repensar condutas e de buscar novas
estratégias de intervenção, evitando erros. Além de trazer mais conhecimento, a
educação permanente influenciará o lado pessoal, profissional e social,
tornando-se assim de grande importância envolvendo os membros do Núcleo de
Segurança do Paciente(20,21). Além disso, todo o envolvimento
da equipe fortalecerá uma melhor interação e reflexão em diversas situações de
trabalho, precavendo uma boa assistência à saúde(13).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os
resultados desta pesquisa apontam que a atuação do Núcleo de Segurança do Paciente
é primordial para alcançar uma cultura de segurança do paciente na instituição.
Sua atuação não deve ser de forma empírica, pois todos os envolvidos precisam
conhecer as suas competências, saber fazer e agir, e contribuir com o
desenvolvimento das estratégias de melhorias.
Apesar
de atribuírem importância ao NSP, os enfermeiros consideram a atuação deste
incipiente, e os membros precisam criar mecanismos que possibilitem uma melhor
capacitação dos profissionais, seja por meio de grupos educativos, de
abordagens mais enfáticas nos cursos de graduação de Enfermagem ou realizações
de capacitações setoriais, com a finalidade de promover mudanças de
comportamento e a disseminação deste conhecimento.
Considera-se
a atuação do NSP como um avanço importante para a instituição, pois com sua
atuação efetiva pode haver progressão com as notificações de eventos adversos,
o que auxilia na redução do erro e contribui com o programa educativo.
Destaca-se
que somente a criação do núcleo na instituição não é capaz de transformar a
realidade e permitir o alcance de práticas
seguras.
Os profissionais membros do NSP devem estar engajados em desenvolver uma
cultura de segurança na instituição, e além disso, devem ser preparados para
uma atuação efetiva.
Foi
possível observar limitações que englobam, principalmente, o fato de este
estudo ter envolvido apenas membros de um NSP de um único cenário hospitalar,
além de ser uma estratégia nova no país, com dificuldades em analisar a atuação
desta equipe e seus impactos na segurança do paciente, identificando a
necessidade de novos estudos na área.
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