REVISTA NORTE MINEIRA DE ENFERMAGEM

ISSN: 2317-3092

 

 

 

Como citar este artigo

 

Lima JL, Siman AG, Amaro MOF, Santos FBO. A atuação do núcleo de segurança do paciente: almejando um cuidado seguro. Rev Norte Mineira de enferm. 2019; 8(2):73-81.

Autor correspondente

 

Andréia Guerra Siman.

ago.80@hotmail.com

 

 

 

ARTIGO ORIGINAL

A ATUAÇÃO DO NÚCLEO DE SEGURANÇA DO PACIENTE: ALMEJANDO UM CUIDADO SEGURO

 

Patient safety security core activities: achieving safe care

Jércica Lopes de Lima1, Andréia Guerra Siman2, Marilane de Oliveira Fani Amaro3, Fernanda Batista Oliveira Santos4

 

1 Enfermeira. Graduada na Universidade Federal de Viçosa. Viçosa, Minas Gerais, Brasil.

2 Professora Adjunta. Universidade Federal de Viçosa, Doutora em Enfermagem, Viçosa, Minas Gerais, Brasil.

3 Professora Adjunta. Universidade Federal de Viçosa. Viçosa, Minas Gerais, Brasil.

4 Professora Adjunta. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.

 

 

 

Objetivo: compreender a atuação do Núcleo de Segurança do Paciente sob a ótica dos membros enfermeiros. Métodos: estudo de caso com abordagem qualitativa. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas, com roteiro semiestruturado, com seis enfermeiros membros do Núcleo. Foi feita análise de conteúdo de Bardin. Resultados: a atuação do Núcleo gira em torno de desenvolver estratégias de melhorias e desenvolvimento da cultura de segurança do paciente. Os membros do Núcleo ainda têm dificuldades de reconhecer e desenvolver suas competências. A atuação relaciona-se à ações corretivas, propondo melhorias frente ao erro, mas não há destaque em ações preventivas. Conclusões: evidenciou-se que só a criação do núcleo na instituição é incipiente. Há a necessidade de criar mecanismos que possibilitem uma melhor capacitação, planejamento e divulgação das ações estratégicas do Núcleo, buscando garantir um cuidado seguro aos pacientes.

 

Descritores: Segurança do Paciente; Gestão da Qualidade; Qualidade da Assistência à Saúde; Hospitais.

 

Objective: To understand the performance of the Patient Safety Center from the perspective of nurses in a teaching hospital. Methods: case study with qualitative approach. Data collection was performed through interviews, with semi-structured script, with six nurses members of the Center. The analysis used was content analysis. Results: The Nucleus's work revolves around developing strategies for improvement and development of the patient safety culture. Nucleus members still have difficulty recognizing their competencies, but with implementation there has been progression in adverse event notifications and error awareness. Conclusions: it was evidenced that only the creation of the nucleus in the institution is incipient. There is a need to create mechanisms that enable better training, planning and dissemination of the core strategic actions, seeking to ensure safe care for patients. 

 

Keywords: Patient Safety; Quality management; Quality of Health Care; Hospitals.

INTRODUÇÃO

 

A segurança do paciente tem sido o tema central de discussões na área da saúde em quase todas as partes do mundo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem enunciado vários desafios e diretrizes nesta área, no sentido de fornecer subsídios para a discussão nos serviços de saúde, como um ponto de partida para implantar e promover medidas de segurança do paciente. Esta é compreendida como redução do risco, a um mínimo aceitável, de danos desnecessários associados ao atendimento em saúde(1).

 

Há mais de dez anos um relatório foi divulgado pelo Instituto de Medicina dos Estados Unidos: “Errar é humano: construindo um sistema de saúde mais seguro”, no qual se investigou prontuários de 30.121 internações e identificou-se que sérios prejuízos iatrogê­nicos haviam ocorrido em 3,7% das internações (6,5% dos quais provocaram disfunções permanente e 13,6% envolveram a morte do paciente­(2,3).

 

Após a publicação desse relatório, enfatizou-se a redução urgente de eventos adversos em todo o mundo. Em se tratando da assistência à saúde nos hospitais brasileiros, supõe-se que os erros e seus efeitos são notavelmente maiores, visto à fragilidade dos serviços prestados seja por meio da escassez de profissionais, da carga horária excessiva, estresse, déficit de recursos materiais e à precária remuneração dos profissionais(4).

 

Com o intuito de reduzir os erros e promover práticas mais seguras, as instituições de saúde estão investindo em ações que primem pela qualidade assistencial e busquem o desenvolvimento de uma cultura de segurança. Esta pode ser definida como um conjunto de valores, atitudes, competências e comportamentos que estabelecem o comprometimento com a gestão de saúde e da segurança, desviando a culpa e a penalização pela oportunidade de aprender com os erros e aprimorar a atenção à saúde(5).

 

No Brasil, foi lançado em abril de 2013 o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP) e publicada a Resolução da Diretoria Colegiada número 36/2013, que conferem ações para a segurança do paciente nos serviços de saúde, tornando-se obrigatório a nomeação de um Núcleo de Segurança do Paciente (NSP) em hospitais públicos, privados, filantrópicos, civis ou militares responsável por desenvolver ações e estratégias para o desenvolvimento de uma cultura de segurança. O Núcleo propõe, sobretudo, minimizar a ocorrência de danos e eventos adversos direcionados aos pacientes que necessitam de cuidados, fornecendo mais qualidade ao serviço prestado e incentivando as notificações dos eventos adversos. O NSP deve ser composto por uma equipe multidisciplinar comprovadamente capacitada em segurança do paciente e ou gerência de risco(5).

 

Neste contexto, para maior segurança do paciente é necessário que todos os profissionais da saúde estejam familiarizados com essa temática, enfatizando os enfermeiros. Estes são profissionais de saúde que necessitam de conhecimento aprofundado e atualizado para prevenir e minimizar complicações locais e/ou sistêmicas ao paciente, reduzir gastos desnecessários e garantir uma melhor qualidade ao serviço proporcionado. Além disso, vale ponderar que as instituições ainda estão aprendendo e se adaptando aos NSP, justamente pela normatização ser uma proposta relativamente nova. Assim, ainda há poucos estudos que contribuam com a discussão da atuação do Núcleo na perspectiva de avanços na prática profissional e redução de danos ao paciente.

 

No âmbito internacional, as discussões envolvem estratégias e mecanismos envolvendo a equipe multiprofissional, que vem sendo desenvolvidos para reduzir os eventos adversos e melhorar a segurança do paciente nas instituições de saúde, como mecanismos para reduzir quedas e lesões em pacientes; favorecer recursos humanos, inclusive aumentar o número de enfermeiros nas instituições, dentre outros(6-8).

 

Pensando no papel do enfermeiro nos NSP, problematizado em relação ao alcance de práticas seguras, em uma disciplina teórico-prática “Gerência em Enfermagem” de um curso de graduação em Enfermagem de uma universidade pública, surgiu a questão central deste estudo: Como o NSP atua para alcançar e desenvolver a segurança do paciente na perspectiva desses profissionais? Acredita-se que estudos desta natureza são relevantes, pois apoiam a redução das lacunas do conhecimento em relação a segurança do paciente e têm potência para contribuir com a disseminação desta cultura nas instituições de saúde. Diante do exposto, objetivou-se compreender a atuação do Núcleo de Segurança do Paciente sob a ótica dos membros enfermeiros.

 

MÉTODOS

 

Este estudo é parte de um projeto maior, da equipe de pesquisadores, intitulado “Estratégias para alcançar as ações da política nacional de Segurança do paciente em hospitais de ensino”. Trata-se de um estudo de caso qualitativo, que tem como foco a análise de uma unidade social, buscando entender os fenômenos sociais complexos e responder “como” e “por que” eles ocorrem. Esse método de pesquisa foi escolhido, pois permite o pesquisador captar características significativas presentes em contexto real(9). Portanto, a escolha teórica metodológica atende a compreensão do fenômeno estudado que se refere a atuação de um NSP de um hospital de ensino sob o olhar do enfermeiro.

 

O cenário de pesquisa foi um hospital de ensino, localizado na Zona da Mata de Minas Gerais, escolhido por se tratar de um local de referência com atendimento de alta complexidade. Trata-se de uma instituição que possui serviço de Nefrologia, Hemodinâmica, Urgência e Emergência, Centro de Tratamento Intensivo adulto. Oferece serviço de internação e de Pronto Atendimento de urgências e emergências à população da cidade e a uma microrregião de oito municípios.

 

A população do estudo foi intencional, composta por seis enfermeiros que faziam parte do NSP e que supervisionavam os seguintes setores: Centro de Tratamento Intensivo, Bloco Cirúrgico, Pronto Socorro, Hemodinâmica, Hemodiálise e Clínica Médica. O NSP deste hospital foi criado em 2013 e é composto por seis enfermeiros, um farmacêutico, dois administradores e um nutricionista.

 

Os critérios de inclusão foram: ser enfermeiro, ser membro efetivo do NSP e tempo mínimo de vínculo na instituição de um ano. O critério de exclusão foi estar afastado do cargo por qualquer motivo. A escolha por estes participantes enfermeiros foi pelo interesse de compreender o núcleo sob a ótica desse profissional, que tem em seu percurso formativo o gerenciamento de serviço de saúde e a assistência direta ao paciente.

 

A coleta de dados foi realizada de maio a junho de 2016 por meio de entrevistas, com roteiro semiestruturado, previamente elaborado pelo pesquisador. Foi realizado teste piloto com dois enfermeiros, de outra instituição hospitalar, sem necessidade de alterações e seus conteúdos não foram utilizados na pesquisa. As questões abordadas foram: conceitue com suas palavras o que você entende por Núcleo de Segurança do Paciente; comente sobre a importância do Núcleo de Segurança do Paciente para a intuição hospitalar; como ele funciona, suas ações e dificuldades encontradas. As perguntas fechadas foram referentes à caracterização dos entrevistados. As entrevistas duraram em média vinte minutos e ocorreram dentro do próprio setor, em uma sala reservada, agendadas previamente, o que se configurou em um local favorável para o participante expor com tranquilidade e segurança as suas vivências. Os depoimentos foram gravados mediante autorização dos participantes do estudo e posteriormente transcritos na íntegra. Para assegurar o anonimato dos sujeitos estes foram referenciados utilizando-se a associação da letra E, de enfermeiro, e o número da entrevista.

 

Para análise dos dados, foi realizada a técnica de análise de conteúdo, seguindo as seguintes fases cronológicas: pré análise, exploração do material e tratamento dos resultados, inferência e interpretação(10). Assim, inicialmente foi realizada uma leitura flutuante e exaustiva das questões das entrevistas, de forma a interagir com o texto e obter uma compreensão sobre o que o sujeito buscava transmitir. Em seguida procedeu-se a exploração do material colhido, tornando as informações cada vez mais claras e apropriadas ao propósito do estudo e por fim, o tratamento dos resultados, onde o pesquisador procurou torná-los significativos, válidos à pesquisa, analisados à luz da literatura(10).  Foram elaboradas três categorias de análise, assim denominadas: “A percepção dos enfermeiros sobre o Núcleo de Segurança do Paciente”; “A importância do Núcleo de Segurança do Paciente para a instituição” e “Proposta para avançar na segurança do paciente”.

 

A pesquisa foi desenvolvida respeitando os aspectos éticos, conforme a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde e submetida à apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, com parecer nº 1.512.189. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

RESULTADOS

 

Os participantes do estudo eram predominantemente do sexo feminino (83%), a faixa etária encontrada foi de 33 a 46 anos. O tempo de formação variou entre 04 a 21 anos. Todos ocupavam cargo gerencial, mas todos tinham especialização na área assistencial. O tempo de exercício profissional no setor atual era de 01 a 17 anos. Foi identificada escala de trabalho diário de 12 por 36 horas. Apenas um enfermeiro tinha duplo vínculo empregatício, com um segundo vínculo na área acadêmica. Seguem as categorias elaboradas a partir da análise dos dados:

 

A percepção dos enfermeiros sobre o núcleo de segurança do paciente

 

Nesta categoria, foi identificado que mesmo na posição de membros efetivos do NSP, esses profissionais não conheciam muito bem as suas competências, para atuação efetiva na comissão. No entanto, apesar de não saberem na íntegra suas atribuições e não apresentarem exposições fundamentadas sobre o assunto, reconheceram a importância de uma atuação profissional de forma segura, e a importância de uma atuação de forma a minimizar erros e prevenir danos, conforme depoimentos:

 

“O Núcleo é tudo aquilo que proporciona a segurança ao paciente, busca prevenir todo e qualquer dano ao paciente. Eu não conheço as normas específicas. Essa questão da segurança do paciente é bem ampla. Então, acho que envolve muita coisa nisso” (E1).

 

“O NSP é uma comissão que temos aqui mais assim, detalhes por detalhes eu não lembro não sinceramente” (E2).

 

Os depoimentos abordam a preocupação dos participantes com os riscos assistenciais e com a prestação de um cuidado com qualidade. Nos depoimentos, identifica-se a compreensão dos profissionais em prestar cuidados seguros durante todo o processo da internação clínica do paciente, e explicitaram medidas estratégicas como a identificação do paciente, comunicação, medicação e prevenção de quedas, conforme depoimentos:

 

“Eu entendo como Núcleo de Segurança do paciente é o Núcleo que prevê o que pode acontecer com o paciente o que a gente pode prevenir para não acontecer. Às vezes tem um chão que está escorregando então o Núcleo de Segurança vai reunir e conversar a respeito daquele piso “[...]”. O Núcleo de segurança é aquilo que resguarda o paciente [...]” (E4).

 

“Núcleo! Ah o que eu entendo que tem vários passos, aí tem a identificação do paciente, a gente vai comunicar com o paciente o que está sendo feita, a gente vai identificar os medicamentos, zelar pela segurança do paciente” (E5).

 

“O Núcleo funciona, é para a melhoria do atendimento ao paciente” (E3).

 

“Então, segurança do paciente para mim é que o paciente entra, por exemplo, para fazer qualquer procedimento e ele saia com esse problema que ele chegou resolvido, sem nenhuma intercorrência durante esse período que ele fique aqui dentro. Então, ele tem que sair melhor do que ele entrou. O núcleo tem que atuar neste sentido” (E6).

 

 

A importância do Núcleo de Segurança do Paciente para a instituição

 

Nesta categoria foi abordado o reconhecimento que os participantes dão ao NSP, como algo positivo para a instituição, trazendo consigo melhorias e segurança tanto para o profissional quanto para o paciente. Alguns participantes destacaram a possibilidade da melhoria da qualidade com a implantação do Núcleo e suas ações, evidenciado nos depoimentos:

 

“Sim, eu acho que a partir do momento que você trabalha com segurança, a sua qualidade vai melhor né, tanto do paciente e para a gente que trabalha também, na verdade para os profissionais, todos que atuam aqui dentro” (E6).

 

“Com certeza! Porque o núcleo vai dar segurança para aquele paciente, para que não ocorra nenhum problema com ele”[...] (E3).

 

“Eu acho que é importante sim, eu acho não, tenho certeza, o objetivo é de melhorar e não piorar a situação do paciente, se ele vier para o hospital e já vem com um dano, você causar outro é difícil” (E2).

 

Alguns participantes expressaram que a partir da implantação e trabalho do Núcleo, houve progressão com as notificações de EA na instituição e uma maior conscientização do erro por parte de toda a equipe. O NSP tem trabalhado dentro de uma perspectiva em corrigir erros e propor melhorias futuras dentro da segurança do paciente, conforme expressam os depoimentos:

 

“É importante a atuação do núcleo e estamos melhorando. Eu observo assim, através das notificações está tendo melhora entendeu? Temos que melhorar muito ainda, mas algumas coisas já mudaram [...]” (E1).

 

“Sim! Uma base para não ter erro de medicação, erro nenhum ao paciente, eu acho que é muito importante” (E4).

 

“O paciente dá entrada aqui com um tipo de patologia e, uma coisa simples que vou citar é a úlcera por pressão. O paciente entra sem á úlcera e geralmente depois sai com a úlcera, é seguro isso? Não” (E5).

 

Na visão dos enfermeiros, o Núcleo pode contribuir com o desenvolvimento da cultura de segurança do paciente, melhorando a assistência, auxiliando na identificação e diminuição dos erros. Assim, destacam o NSP como uma base para direcionar uma prática assistencial segura, importante em todo processo de tratamento ou reabilitação do paciente. Foi possível identificar nos depoimentos a citação de algumas metas internacionais de segurança do paciente, como, a identificação do paciente e o cuidado com a medicação, no entanto, não mencionaram os protocolos de segurança ou o plano de ação do NSP.

 

Propostas para avançar na segurança do paciente

 

Esta categoria demonstra a necessidade do desenvolvimento de treinamentos, pesquisas e educação permanente, na visão dos participantes, a fim de ser apresentados na íntegra as funções do NSP, o que não implica, necessariamente, mais recursos da instituição. Trata-se de uma estratégia que precisa ser desenvolvida não só com os membros do núcleo como para toda a equipe de saúde, envolvendo principalmente os técnicos de enfermagem que participam de forma direta no cuidado ao paciente, conforme os depoimentos:

 

“Eu acho que é importante ser divulgado, tem que ser estudado em todas as instituições que trabalham nesta área”. (E3)

 

“A instituição deveria, não só aos enfermeiros, mas também os técnicos, ter um pouco mais de atenção para isso. Desenvolver treinamentos, palestras, pesquisas, porque assim, nós não temos muito tempo hábeis para fazer educação continuada, essas coisas, devido até falta também de profissionais. Aqui dentro é bem tranquilo, mas quando saio aí fora, é bem complicado [...]” (E5).

 

“Eu acho que esse tema precisa ser abordado. Acho que hoje a gente precisa é debater mais sobre esse tema do Núcleo, porque às vezes a gente fica pensando em uma coisa em longo prazo. Às vezes a segurança do paciente é coisa boba, coisa pequenininha, dá para a gente fazer, poder assegurar o paciente. Acho que isso é boa vontade [...]”(E1).

 

Os depoimentos trouxeram que a instituição precisa avançar nas questões de segurança do paciente, conceito que precisa ser compreendido e realizada por todos da equipe, além de ter um profissional exclusivamente para direcionar o NSP e não compartilhar outras atribuições:

 

“Este tema está sendo bem discutido agora. Acho que ele é interessante e tem que bater na tecla mesmo para ver se implanta. Temos que ter uma pessoa só para fazer esse papel, lá para frente mesmo” (E2).

 

Outro avanço expresso no depoimento, é a disponibilidade de recursos humanos e financeiros para avançar nas estratégias e desenvolver uma cultura se segurança em todo o hospital:

 

“Eu acho que é uma questão tem que batalhar, trabalhar dentro de todo o hospital. Aqui no hospital, a gente precisa muito de trabalhar isso, mas, às vezes, o que falta mesmo é o pessoal, mão de obra. É recursos humanos, recursos de dinheiro. Então, acho que isso tudo a gente precisa para melhorar” (E6).

 

DISCUSSÃO

 

De acordo com os resultados apresentados, percebe-se que faltam os enfermeiros adquirirem informações necessárias no desenvolvimento de competências a serem desenvolvidas como integrantes do NSP. O conceito de competência foi introduzido também nas propostas de formação e atualizações profissionais. Nesta lógica, competência relaciona-se a uma combinação de Conhecimento, Habilidade e Atitude, apreendida durante processos educativos e expressa pelo indivíduo mediante seu comportamento num determinado contexto profissional(11). Neste caso, no cenário estudado, dentro do contexto da segurança do paciente, falta o enfermeiro desenvolver saberes e habilidades para sua atuação no núcleo.

 

Sobretudo, é necessário destacar que a estratégia de implantação do Núcleo ainda é algo novo para as instituições de saúde, o que configura um processo que está em construção, mas que é extremamente importante a atuação desta comissão para desenvolver uma cultura de segurança nos serviços de saúde(5,12).

 

Na primeira categoria, os resultados apontaram que os profissionais demonstraram dificuldades em identificar os papéis a serem desempenhados no NSP, mas reconhecem uma atuação de forma a minimizar erros e prevenir danos. O Núcleo de Segurança do Paciente é uma estratégia do Ministério da Saúde para atender uma necessidade de melhorar a segurança do paciente no serviço de saúde. Trata-se de instância do serviço de saúde que tem como objetivo auxiliar a implementação de ações voltadas à segurança do paciente, como por exemplo, a implantação e monitoramento de protocolos(12), mas somente a sua criação não garante a finalidade maior da sua existência, que é a efetiva segurança do paciente.

 

Na instituição estudada, o Núcleo de Segurança do Paciente foi criado em 2013, sendo um ato compulsório em todos os serviços de saúde. No entanto, mesmo se configurando como ato obrigatório à instituição, os profissionais ainda não estavam contextualizados e cientes das competências a serem desenvolvidas, o que implica em fragilidades para a sua construção, lacunas do conhecimento e invisibilidades do Programa de Segurança do Paciente.

 

Torna-se fundamental entender a razão da existência de uma comissão institucional e agregar sentido ao trabalho aos profissionais envolvidos. Dar sentido para aqueles que o realizam pode orientar as decisões e as intervenções dos responsáveis no processo de transformação organizacional. Dar sentido para aquilo que é executado muda a forma de pensar, repensar, buscando realizar um exercício constante de interrogação do que se executa em suas ações diárias(13).

 

Avançando na reflexão sobre a invisibilidade do Programa dentro da instituição estudada, isso pode refletir direta ou indiretamente na qualidade e segurança do paciente dentro do hospital, necessitando de corresponsabilidades da própria administração, líderes e demais profissionais. Os integrantes do Núcleo de Segurança do Paciente precisam assumir uma postura proativa, interagindo com os vários setores da instituição e discutindo possíveis soluções para os problemas encontrados, mas, para isso, precisam avançar em conhecer mais sobre as atividades e competências do NSP e seu principal objetivo(14).

 

Os resultados encontrados demonstram a necessidade de medidas de atualização das suas competências de um integrante do NSP e como auxiliar no desenvolvimento de uma cultura de segurança do paciente. Vale ressaltar que o Programa Nacional de Segurança do Paciente é composto por seis metas internacionais específicas às quais norteiam os profissionais por meio de protocolos, sendo elas: Identificação do paciente; comunicação segura, administração de medicamentos; cirurgia segura; higiene das mãos e prevenção de lesão por pressão e quedas(5,14). Nos resultados, os profissionais demostraram conhecer e buscar cumprir essas metas evidenciando uma atuação influenciada pela formação, vivências, dentre outros aspectos.

 

Na segunda categoria, os enfermeiros mencionaram o NSP como algo importante para a instituição, que atua de forma a impedir que os erros cheguem de forma direta e indireta aos pacientes. A criação e atuação do NSP proporcionou a identificação de eventos adversos e um avanço nas notificações, presumindo um decréscimo de erros e reincidência de casos. A partir do momento que notificações são realizadas, há uma maior cobrança em fiscalizar situações que rotineiramente, poderiam ficar invisíveis ao serviço de saúde, seja pelo tecnicismo diário ou pela sobrecarga de trabalho dos profissionais. A notificação de eventos adversos é realizada por meio do Sistema Nacional de Notificações para a Vigilância Sanitária (NOTIVISA), o qual deverá manter o setor e ou a instituição atualizada dos resultados da análise, encorajando todos profissionais a divulgação de falhas(14). Notificar deve ser uma preocupação e um dever de toda a equipe de saúde, desde profissionais a pacientes ou familiares que percebem a falha(15).

 

A notificação é considerada uma medida preventiva, uma vez que identifica e investiga o erro, proporcionando a execução de planos de ação e identificação de causa raiz, treinamentos e evitando reincidência de danos aos pacientes(5).

 

A Organização Mundial de Saúde estima que danos à saúde ocorram em dezenas de milhares de pessoas todos os anos no mundo, e, no Brasil, estudos mostram que a incidência de eventos adversos é alta, sendo 66% considerados evitáveis(16). Cabe ressaltar que evento adverso é o incidente que resulta em danos à saúde. Tais incidentes causam prejuízos ao paciente, familiares e a todo sistema de saúde e ocorrem devido às falhas decorrentes de processos ou estruturas da assistência(5).  Um estudo realizado na Colômbia avaliou relatórios de eventos adversos em uma instituição de ensino superior no ano de 2011, no qual concluiu que no total de 353 pacientes que foram admitidos no hospital, 54 tiveram eventos adversos, dos quais 55% eram por administração de medicamentos(17).

 

Um estudo norueguês(6) identificou que as taxas de eventos adversos diminuíram, em hospitais públicos e privados, após quatro anos de monitorização dos eventos evitáveis, com campanhas para melhorar a segurança do paciente e reduzir o dano(6). Em se tratando da realidade brasileira, um estudo realizado em três hospitais de ensino do Rio de Janeiro no ano de 2013, indicou uma incidência de eventos adversos de 5,1% com proporção de 66,7% entre os eventos adversos evitáveis sendo esses responsáveis por 373 dias adicionais dos pacientes no hospital(18).

 

Esses dados remetem à importância de uma atuação ativa do NSP dentro da instituição, auxiliando os profissionais por meio de estratégias simples e efetivas, prevenindo e reduzindo riscos e danos aos pacientes, por meio da notificação de eventos adversos, seguimento de protocolos específicos, estabelecendo plano de ação e melhorias, tudo com o direcionamento dos membros do NSP(19). A falta de compreensão sobre o erro, sobre a segurança do paciente ou atribuições do NSP podem acarretar um serviço inseguro e uma assistência sem qualidade. Por isso, torna-se imprescindível aprofundar o conhecimento para implantar estratégias de melhorias eficazes para a segurança do paciente. Neste sentido, propõe-se realizar o planejamento estratégico das ações, divulgação e avaliação dessas estratégias, com envolvimentos de todos os profissionais.

 

Na terceira categoria é identificado, na visão dos participantes, a necessidade de se implantar medidas para divulgação e capacitação do NSP para toda equipe de saúde, face a carência de conhecimento sobre a temática. Necessário se faz reforçar o enfrentamento das dificuldades do NSP com o intuito de juntos poderem repensar estratégias eficazes que vão ao encontro das metas internacionais, como a formulação de protocolos e plano de segurança do paciente, trazendo um cuidado com qualidade e com redução de erros.

 

É imprescindível difundir este conhecimento a todos os setores da instituição, aos técnicos de enfermagem, que demandam grande parte dos serviços em contato direto com os pacientes, fornecendo informações, esclarecimentos, tirando dúvidas e receios dos profissionais quanto à punição de notificação. Salienta-se também incentivar uma boa comunicação e interação entre os membros da equipe e família, impedindo dupla interpretação das informações geradas, desde a identificação a qualquer procedimento, evitando assim, a ocorrência de eventos adversos(5).

 

Uma fragilidade identificada nessa categoria foi o fato dos profissionais abordarem a segurança do paciente como algo em longo prazo, devido a dificuldades de recursos humanos e financeiros. O NSP não vem com mudanças radicais, e sim, reforçar transformações mínimas, rotineiras que são obrigações diárias, mas que infelizmente muitos profissionais, por esperar resultado em longo prazo acabam menosprezando o básico, proporcionando o erro e omissão na assistência.

 

Além disso, nos depoimentos, os profissionais expressaram ser necessário um profissional responsável exclusivamente pelo NSP. O responsável pelo Núcleo, ou o gerente de risco, assumia outras responsabilidades como a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar e Gestão da Qualidade.

 

A magnitude do erro e dos problemas ocasionados por ele pode ser extenso demais em comparação a ações mínimas que o NSP prevê. Portanto, enfatiza-se que instituir grupos educativos, a educação permanente, palestras e outros afins, capacitando os profissionais periodicamente, impede o desgaste ao sistema de saúde, aos pacientes e familiares. A educação permanente leva o profissional a refletir sobre sua prática, entender os processos de trabalho nos quais estão inseridos, tendo a possibilidade de repensar condutas e de buscar novas estratégias de intervenção, evitando erros. Além de trazer mais conhecimento, a educação permanente influenciará o lado pessoal, profissional e social, tornando-se assim de grande importância envolvendo os membros do Núcleo de Segurança do Paciente(20,21). Além disso, todo o envolvimento da equipe fortalecerá uma melhor interação e reflexão em diversas situações de trabalho, precavendo uma boa assistência à saúde(13).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Os resultados desta pesquisa apontam que a atuação do Núcleo de Segurança do Paciente é primordial para alcançar uma cultura de segurança do paciente na instituição. Sua atuação não deve ser de forma empírica, pois todos os envolvidos precisam conhecer as suas competências, saber fazer e agir, e contribuir com o desenvolvimento das estratégias de melhorias.

 

Apesar de atribuírem importância ao NSP, os enfermeiros consideram a atuação deste incipiente, e os membros precisam criar mecanismos que possibilitem uma melhor capacitação dos profissionais, seja por meio de grupos educativos, de abordagens mais enfáticas nos cursos de graduação de Enfermagem ou realizações de capacitações setoriais, com a finalidade de promover mudanças de comportamento e a disseminação deste conhecimento.

 

Considera-se a atuação do NSP como um avanço importante para a instituição, pois com sua atuação efetiva pode haver progressão com as notificações de eventos adversos, o que auxilia na redução do erro e contribui com o programa educativo.

 

Destaca-se que somente a criação do núcleo na instituição não é capaz de transformar a realidade e permitir o alcance de práticas

seguras. Os profissionais membros do NSP devem estar engajados em desenvolver uma cultura de segurança na instituição, e além disso, devem ser preparados para uma atuação efetiva.

 

Foi possível observar limitações que englobam, principalmente, o fato de este estudo ter envolvido apenas membros de um NSP de um único cenário hospitalar, além de ser uma estratégia nova no país, com dificuldades em analisar a atuação desta equipe e seus impactos na segurança do paciente, identificando a necessidade de novos estudos na área.

 

REFERÊNCIAS

 

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