REVISTA NORTE MINEIRA DE ENFERMAGEM
ISSN: 2317-3092
Recebido em: 22/06/20 23 Aprovado em: 23/09/202 3
Como citar este artigo
Souza JB, Beckert RAT, Rosario E, Pilger KCP , Mafra SK, Almeida AC. Sentimento s Despertados Durante a Espera de Notícias de um Familiar em Cirurgia. Rev Norte Mineira de enferm. 2023; 12(1):35-43.
Autor correspondente
Jeane Barros de Souza
Universidade Federal de Santa Catarina Correio eletrônico: jeane.souza@uffs.edu.br
ARTIGO ORIGINAL
SENTIMENTOS DESPERTADOS DURANTE A ESPERA DE NOTÍCIAS DE UMFAMILIAR EM CIRURGIA
FEELINGS AWAKENED DURING WAITING FOR NEWS ABOUT A FAMILY MEMBER UNDER SURGERY
Jeane Barros de Souza1, Richard Augusto Thomann Beckert 2, Evelyn do Rosario3, Kelly Cristina de Prado Pilger 4, Samantha Karoline Mafra5, Andreina Carla de Almeida6 .
1 Pós-doutorado em Enfermagem pela Universidade Federal de Santa Catarina - SC, Universidade Federal da Fronteira Sul - Chapecó, SC, BR, jeane.souza@uffs.edu.br, Orcid ID: https://orcid.org/0000-0002-0512-9765
2 Acadêmico de Enfermagem pela Universidade Federal da Fronteira Sul - Chapecó, SC, BR, ritbeckert@hotmail.com, Orcid ID: https://orcid.org/0000-0002-3788-0991
3 Acadêmica de Enfermagem pela Universidade Federal da Fronteira Sul - Chapecó, SC, BR, evrosario.evelyn@gmail.com, Orcid ID: https://orcid.org/0009-0003-2644-7476
4 Acadêmica de Enfermagem pela Universidade Federal da Fronteira Sul - Chapecó, SC, BR, kellycristinadeprado23@gmail.com, Orcid ID: https://orcid.org/0000-0002-5670-7799
5 Acadêmica de Enfermagem pela Universidade Federal da Fronteira Sul - Chapecó, SC, BR, samantha.mafra@estudante.uffs.edu.br, Orcid ID: https://orcid.org/0000-0002-3305-6516
6 Acadêmica de Enfermagem pela Universidade Federal da Fronteira Sul - Chapecó, SC, BR, andreinacarlauffs@gmail.com, Orcid ID: https://orcid.org/0000-0001-5567-895X
DOI: https://doi.org/10.46551/rnm20230104
Objetivo: compreender os sentimentos despertados nos familiares que aguardam notícias de seus entes queridos em procedimento cirúrgico. Método : estudo descritivo, exploratório, de abordagem qualitativa, com a participação de 15 familiares que aguardavam notícias de um ente querido, em uma sala de espera de cirurgia de um hospital público de Santa Catarina, Brasil. A coleta de dados ocorreu por meio de entrevista semiestruturada, realizadas em setembro e outubro de 2021. Os dados foram organizados conforme análise de conteúdo. Resultados: os entrevistados relataram sentimentos vivenciados durante a espera por notícias de seus entes queridos: ansiedade, desânimo, tristeza, apreensão, preocupação, angústia, aprendizado e troca de experiências. Considerações finais: nota-se a importância da comunicação entre profissionais da saúde e familiares dos pacientes em cirurgia, com vistas a promover segurança e tranquilidade, o que contribui para o cuidado integral e humanizado.
DESCRITORES: Salas de espera; Hospitalização; Emoções; Enfermagem de Centro Cirúrgico; Promoção da Saúde.
Sentimentos Despertados Durante a Espera de Notícias de um Familiar em Cirurgia
Objective: to understand the feelings aroused in family members who await news of their loved ones undergoing a surgical procedure. Method: descriptive, exploratory study, with a qualitative approach, with the participation of 15 family members who were waiting for news about a loved one, in a surgery waiting room of a public hospital in Santa Catarina, Brazil. Data collection took place through semi-structured interviews, carried out in September and October 2021. The data was organized according to content analysis. Results : interviewees reported feelings they experienced while waiting for news from their loved ones: anxiety, discouragement, sadness, apprehension, worry, anguish, learning and exchanging experiences. Final considerations: the importance of communication between health professionals and family members of patients undergoing surgery is noted, with a view to promoting safety and tranquility, which contributes to comprehensive and humanized care.
DESCRIPTORS: Waiting rooms; Hospitalization; Emotions; Surgical Center Nursing; Health promotion.
INTRODUÇÃO
Com o avanço do conhecimento científico, associado às inovações tecnológicas, diversos procedimentos cirúrgicos foram
sendo implementados (1). Existem inúmeros tipos de cirurgia: curativas, paliativas, diagnósticas, eletivas, reparadoras e
reconstrutivas/esteticistas. Desse modo, muitos indivíduos ainda poderão, por motivos heterogêneos, necessitar de intervenções cirúrgicas e consequentemente, também por uma internação hospitalar (20), que envolverá a participação de um familiar ou acompanhante para o aporte emocional durante a recuperação (3).
Diante de uma cirurgia, é comum que o indivíduo que irá ser operado e seu familiar vivenciem alguns desafios por conta do medo e da insegurança, tendo em vista que envolvem riscos. Contudo, durante a preparação para a cirurgia, apesar da intensidade dos sentimentos, revela-se a importância do apoio mútuo, pois ao entrar no bloco cirúrgico, o familiar só irá ter notícias minutos ou horas depois. Esse período de espera de notícias pode ser angustiante para o familiar, pois além de não poder ver o seu ente querido, as notícias geralmente demoram para chegar, ficando à mercê dos pensamentos negativos (3) .
Ressalta-se que para uma cirurgia satisfatória e uma recuperação adequada, é importante que o paciente esteja tranquilo, mesmo sendo difícil enfrentar o ambiente hospitalar. A necessidade de hospitalização para uma intervenção cirúrgica envolve situações desconfortáveis, como a procura por um acesso venoso, utilização de aventais, contato direto com pessoas fora do círculo social, entre inúmeras outras. Infelizmente esses acontecimentos são necessários e afetam tanto o paciente quanto seu familiar, porém podem ser amenizadas com conversa, explicações, estabelecimento de vínculo e práticas alternativas que auxiliam nesse processo (4,5) .
No procedimento cirúrgico, cabe ao enfermeiro garantir a preservação dos direitos do paciente e de seu familiar (4,5). Um deles é mantê-los informados sobre tudo que irá acontecer, o motivo de cada ação, buscando descrever como irá ocorrer cada etapa, assim como o ambiente, os profissionais envolvidos e o tempo previsto. Essas informações, apesar de básicas, fazem toda a diferença, pois estar em um ambiente novo sem ter conhecimento do que irá acontecer é um fator de grande estresse. Quando o paciente e seu familiar são informados, a ansiedade é amenizada, o que irá facilitar no trabalho dos profissionais, auxiliando também na recuperação e no vínculo estabelecido com a equipe (6) .
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Dessa forma, é premente que os profissionais compreendam esse momento de vulnerabilidade, buscando desenvolver a empatia, com o reconhecimento de que os familiares dos pacientes em cirurgia também precisam ser cuidados (7). Tais familiares geralmente desejam proteger seus entes queridos e muitas vezes, não sabem expressar suas angústias, sendo fundamental que profissionais qualificados estejam presentes, realizem um diálogo com palavras de fácil compreensão, em um ambiente tranquilo, proporcionando uma assistência integral e humanizada (6). Essa atenção deve permanecer na sala de espera, visto que o familiar terá acesso a muitas informações da vida de outros pacientes, podendo ser tanto positivas quanto negativas, a qual implicará diretamente em suas expectativas para a cirurgia. Portanto, compreende-se a importância de uma assistência qualificada voltada não somente ao paciente em cirurgia, mas também ao familiar que aguarda informações, buscando promover saúde no ambiente hospitalar (6,7) .
Define-se a promoção da saúde, pela Carta de Ottawa, como um processo que visa permitir às pessoas um aumento do controle e a melhoria da saúde. Além disso, a Carta pontua cinco eixos de ação, sendo eles: a elaboração e implementação de políticas públicas saudáveis; a criação de ambientes favoráveis à saúde; o reforço da ação comunitária; o desenvolvimento de habilidades pessoais; e a reorientação do sistema de saúde. Ademais, o documento opõe-se ao modelo biomédico, pautado na saúde como ausência de doença, e aborda a necessidade de capacitar a população para promover a saúde, por meio da participação no cuidado e efetividade na comunicação entre população e profissionais da saúde (8) .
Além do mais, no ano de 2006, foi implementada no Brasil a Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS), com objetivo de promover a equidade e a melhoria dos modos e condições de viver, em busca de amplificar a potencialidade de saúde coletiva e individual com redução de vulnerabilidades e riscos à saúde, pautados nos determinantes de saúde (9). A PNPS apoia-se nos cinco eixos supracitados da Carta de Ottawa e reafirma a relevância do setor saúde, além de buscar superar, com a intersetorialização, a fragmentação do conhecimento e melhorar positivamente a saúde das pessoas e comunidades (10) .
Em uma sala de espera, é comum que entre os familiares haja trocas de informações sobre as histórias que os trouxeram até aquele momento. Por consequência, acarreta sensibilização e empatia fazendo com que essa ação se transforme, involuntariamente, em uma rede de apoio temporária (2). A partir do exposto, emergiu a seguinte questão de pesquisa: Quais os sentimentos despertados nos familiares que aguardam notícias de seus entes queridos em procedimento cirúrgico?
Esta pesquisa poderá contribuir na qualificação da assistência para o paciente em procedimento cirúrgico, sobretudo para o familiar que aguarda notícias na sala de espera do ambiente hospitalar. Faz-se necessário entender os sentimentos mais recorrentes que envolvem o familiar que aguarda notícias de um ente querido em cirurgia, para que haja reflexões e implementações de ações promotoras de saúde, com vistas a minimizar o sofrimento desse período, a fim de tornar o momento mais tolerável e leve, o que justifica a realização deste estudo. Assim, objetivou-se compreender os sentimentos despertados nos familiares que aguardam notícias de seus entes queridos em procedimento cirúrgico.
MÉTODO
Trata-se de um estudo exploratório, descrito, de abordagem qualitativa, fundamento nos pressupostos teóricos da promoção da saúde (11). O manuscrito foi organizado conforme os critérios consolidados para relatar pesquisa qualitativa (COREQ).
O estudo ocorreu em um hospital público de um município localizado em Santa Catarina, Brasil. Contou-se com a participação de 15 familiares que aguardavam, em uma sala de espera do hospital, por notícias de seus entes queridos. Como critério de inclusão, considerou-se familiares que aguardam seus entes queridos na sala de espera de um hospital público do Oeste de Santa Catarina. Como critérios de exclusão, aqueles que não apresentavam condições físicas e ou emocionais para responder a entrevista e menores de 18 anos.
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Os dados foram coletados entre os meses de setembro e outubro de 2021, na sala de espera do referido hospital. Utilizou-se a entrevista semiestruturada, que continha questões que abordavam sobre as vivências e sentimentos despertados nos familiares, enquanto aguardavam notícias na sala de espera do centro cirúrgico. As entrevistas foram conduzidas pelos pesquisadores, com experiência neste tipo de abordagem, com duração de aproximadamente trinta minutos. Foram gravadas e transcritas, com autorização dos participantes mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Para a análise e interpretação dos dados, utilizou-se a análise de conteúdo temática proposta por Minayo. (12) Na primeira etapa, pré-análise, realizou-se a leitura das entrevistas transcritas e organização do material, em busca de definir as unidades de registro. Na etapa seguinte realizou-se a codificação dos dados brutos, buscando atribuir significados aos depoimentos transcritos. Por fim, a partir da análise dos dados, desenvolveu-se a categorização, surgindo duas amplas categorias, sendo que neste artigo será apresentada e discutida uma delas.
No que tange os aspectos éticos, o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) de uma Universidade Federal do Sul do Brasil, com o parecer número 4.960.473, na data de 09 de setembro de 2021, cumprindo às exigências estabelecidas pela Resolução nº. 466/2012. Para preservar o anonimato dos entrevistados, optou-se por denominá-los por sentimentos, surgindo: Alegria, Tristeza, Raiva, Paixão, Saudades, Medo, Frustração, Afeto, Confiança, Empatia, Solidão, Esperança, Compaixão, Ciúmes e Surpresa.
RESULTADOS
Os participantes tinham idade entre 23 e 53 anos. Nove eram do sexo feminino e seis do sexo masculino. Os entrevistados aguardavam por notícias de seus entes queridos na sala de espera do centro cirúrgico entre duas à doze horas, sendo que as relações familiares estabelecidas eram de filhos, cônjuges, ou pais. Na organização e análise de dados, uma das categorias que surgiu foi “Sentimentos vivenciados por familiares enquanto aguardam notícias de seus entes queridos na sala de espera de cirurgia”. Nesta categoria, os integrantes do estudo relataram desconforto na sala de espera do hospital diante dos acontecimentos tristes com outras famílias, somado ao fato de no período pandêmico sentirem-se desprotegidos.
“Estar no hospital, com certeza não é bom, mesmo que a gente esteja aqui por um motivo bom, acaba se tornando um sentimento um pouco triste pelos outros acontecimentos que a gente presencia com outras famílias [...]” (Alegria)
“Não é algo bom estar aqui, [...] no meio da Covid você estar aqui. Porque até o momento que a gente estava aqui, chegou a passar pessoas mortas, daí tu fica preocupado.” (Raiva).
Os entrevistados referiram sentimento de impotência e infelicidade nos momentos em que precisam estar no ambiente hospitalar. Além disso, mencionaram não gostar do ambiente por remeter sofrimento.
“Eu não gosto de ficar aqui no hospital, me dá uma sensação de impotência, parece que é muito sofrimento junto, uma sensação de que não tem felicidade” (Tristeza)
Outros participantes relataram nunca ter adentrado naquele hospital e nem passado pelo processo de hospitalização, sendo algo muito difícil de acompanhar, trazendo um sentimento de desespero.
“[...] Nunca tinha passado por isso, daí é bem complicado. Tudo diferente, nunca entrei nesse hospital, não sabia nada [...] me desesperei no começo.” (Paixão)
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Durante o aguardar de notícias, o familiar também pode sentir angústia e insegurança, pois presencia a situação de seu familiar, bem como de outras pessoas que vivenciam momentos semelhantes de tristeza.
“É angustiante porque você não está só com teu paciente (familiar) aqui. Você está presenciando outros pacientes [...] então além da gente ter angústia do ente querido da gente, a gente presencia outras tristezas.” (Saudades)
“É angustiante (...) e quando é um familiar seu, a gente fica muito inseguro, muito mal, apreensivo, tenso, é bem difícil.” (Frustração)
Outro sentimento atribuído à sala de espera foi a preocupação quanto ao bem-estar do ente querido durante o procedimento cirúrgico, o que gera estresse e ansiedade.
“O sentimento é de preocupação, se ele tá bem, se ele reagiu bem...” (Confiança) “É tenso, porque a gente se preocupa, e se estressa por não ter notícia.” (Afeto)
“Eu fico numa ansiedade. Aí os filhos em casa chamam querendo saber notícias do pai e eu não sei... É bem complicado.” (Paixão)
Ainda, estar em um ambiente hospitalar traz sensação de cansaço e provoca abalo emocional nas pessoas que esperam por informações, pois muitas vezes a internação ocorre de forma abrupta, fazendo com que os familiares se desloquem de seu trabalho ou outra cidade para acompanhar o paciente hospitalizado.
“Cansativo, porque eu vim direto do trabalho...” (Empatia)
“Hoje cedo quando eu tive notícia dela (familiar em cirurgia), eu fiquei sem chão. Porque eu não sou daqui, eu estou só com ela, então pra mim ela é tudo. Isso ai me abalou completamente” (Tristeza)
“Abala o emocional” (Afeto)
Outro sentimento relatado foi o desânimo frente ao ambiente hospitalar e sala de espera, por se tratar de um momento de dificuldades em que não se tem muitas certezas:
“Aqui não tem como se manter animado...” (Solidão)
“Olha, é um pouco difícil, é uma cirurgia. A gente nunca tá livre de acontecer o pior.” (Esperança)
Por outro lado, alguns entrevistados refletiram que a vivência de aguardar notícias de um ente querido na sala de espera do centro cirúrgico pode ser um momento oportuno de trocar experiências e estabelecer vínculos com outras pessoas que enfrentam a mesma situação, o que pode ajudar no fortalecimento mútuo.
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“[...]estar descobrindo a vida de outras pessoas, compartilhar com eles o que todos estamos passando, é uma troca de experiências.” (Alegria)
“Não é fácil estar aqui, porque a gente vê muita tristeza, muitas coisas ruins... mas a gente também faz amizades, troca contato com pacientes, faz orações, ajuda...” (Compaixão)
Ainda, os participantes desvelaram esse momento como um aprendizado, visto que o ambiente hospitalar traz reflexões sobre os acontecimentos da vida.
“É um momento, não só de sofrimento por ver minha mãe assim, mas também de aprendizado. Porque a gente toma como lição tudo que a gente vê aqui [...]” (Compaixão)
Nesse sentido, os familiares demonstraram gratidão por algumas experiências e aprendizados, pois puderam contribuir com outros acompanhantes, assim como ao receber boas notícias dos profissionais sobre a recuperação do seu ente querido.
“[...] ao mesmo tempo, me senti bem porque conheci bastante pessoas, consegui ajudá-los. As pessoas que estão aqui conseguem ajudar a gente também, os acompanhantes. Então, é gratificante esse momento[...]” (Alegria)
“Eu acabei de falar com o médico faz duas horas. Ele falou que ocorreu tudo bem na cirurgia e que ele (familiar) está agora na sala de recuperação, então pra mim saber que está tudo bem, já é grande coisa” (Esperança)
Percebe-se, portanto, que as experiências para cada familiar podem ser diferentes. Alguns demonstraram sentimentos de medo, angústia e incerteza por não saberem do estado de saúde de seus familiares durante o procedimento cirúrgico, além do ambiente hospitalar remeter a um local de doença e sofrimento. Contudo, outros familiares perceberam esse momento como uma oportunidade de trocar experiências com outras pessoas que vivenciavam este processo de espera, trazendo mais tranquilidade para o período.
DISCUSSÃO
O processo de hospitalização pode ser considerado um evento impactante para o paciente e seus familiares, que se deparam com uma realidade desconhecida, uma mudança abrupta da rotina, vivenciando momentos de incerteza e medo, que podem resultar em mudanças emocionais e comportamentais (13,14). Quando a internação hospitalar traz como resultado a necessidade de um procedimento cirúrgico, geralmente de forma inesperada, pode gerar um momento de crise para os familiares (15) .
Quando uma pessoa adentra no centro cirúrgico, seus familiares vivenciam um período de espera até a sua saída. Esse momento é marcado por vários sentimentos, tais como medo, nervosismo, inquietação, sofrimento e ansiedade (15), como também destacado pelos participantes deste estudo. Nesse cenário também pode despontar questionamentos, pois quem está aguardando se depara com um ambiente totalmente desconhecido, cercado de regras e acontecimentos ao qual não está acostumado, ocasionando desconforto e insegurança (15) .
Desse modo, torna-se necessário promover a saúde no ambiente hospitalar, sobretudo na sala de espera, tendo em vista a vulnerabilidade dos acompanhantes que aguardam notícias de seus entes queridos, somado ao tempo ocioso. Assim, criar um
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local agradável e humanizado, que proporcione conforto para os familiares e amigos, torna-se uma estratégia de promover a saúde desses indivíduos, tendo em vista o benefício dessa ação como descrito em uma das cinco estratégias da PNPS (9) .
Uma forma de amenizar o sofrimento e anseio dos familiares que aguardam por notícias dos seus entes queridos, é por meio da comunicação e informação compartilhada pelos profissionais de saúde. Esta ferramenta, por sua vez, é capaz de auxiliar os profissionais a compreender as crenças, preocupações e necessidades dos familiares, com vistas a pensar estratégias promotoras de saúde, a fim de tornar esse momento de espera mais acolhedor e humanizado. Por meio do diálogo com os familiares, também é possível esclarecer dúvidas relacionadas ao quadro do familiar internado, o que promove sensação de segurança e tranquilidade (6) .
Ainda, no âmbito da comunicação e acolhimento, a escuta qualificada permite que o familiar expresse seus sentimentos e compartilhe experiências anteriores relacionadas à hospitalização, que podem acentuar suas sensações de insegurança e preocupação. Além disso, reduz o isolamento social provocado pela espera no ambiente hospitalar e promove o vínculo, colaborando consequentemente com o cuidado em saúde (6). Nesse sentido, o profissional da saúde deve ser referência ao familiar que aguarda na sala de espera, para que este possa buscar as informações necessárias e sentir-se amparado nesse momento (15) .
Ressalta-se que a PNPS define a promoção da saúde como um conjunto de estratégias, que se direcionam para ações profissionais a serem reorientadas, pretendendo tornar os indivíduos mais autônomos em seus processos de saúde-doença, em busca da melhor qualidade de vida (9). Portanto, os familiares precisam sentir-se seguros e informados quanto a situação dos seus entes queridos e cirurgia, cabendo aos profissionais estabelecerem estratégias promotoras de saúde, para que possam buscar vivenciar o momento de espera por notícias de modo mais saudável possível (15) .
Para além dos profissionais, durante a permanência na sala de espera, o contato e troca de saberes e experiências entre os familiares é uma oportunidade de diminuir o desconforto desencadeado nesse ambiente. Nessa perspectiva, os familiares podem dividir entre si estratégias de enfrentamento frente a um momento desafiador, compartilhar experiências anteriores de outras internações, discutir sobre os desafios e anseios encontrados no dia a dia, esclarecer dúvidas e estabelecer novos vínculos. Esse momento de troca, além de possibilitar relações interpessoais, é uma forma de passar o tempo durante o período de cirurgia e internação de seu ente querido, o que faz com que o sentimento de ansiedade seja reduzido. Isto posto, percebe-se que a sala de espera tem a capacidade de promover espaços de compartilhamento de saberes, acolhimento e potencializar a criação de novas amizades (15), como também foi mencionado pelos entrevistados deste estudo.
Ademais, comumente em salas de espera, a própria disposição das cadeiras, alinhadas e em fileiras, diminui a possibilidade de contato visual e comunicação entre as pessoas que estão ali aguardando. Nesse contexto, cabe aos profissionais e sobretudo a gestão das instituições de saúde, buscar promover um ambiente físico mais saudável e acolhedor na sala de espera, criando um cenário favorável para aliviar a tensão e possibilitar maior estabelecimento da interação entre as pessoas que aguardam notícias (6,16). Por outro lado, a sala de espera pode tornar-se um ambiente favorável à introspecção, reflexões e, consequentemente, novos aprendizados, à luz do momento de quietude que propicia (6,16) .
A hospitalização de um ente querido suscita múltiplos sentimentos que, majoritariamente, enquadram o ambiente hospitalar como estopim de sensações negativas. Entretanto, os entrevistados revelaram gratidão e aprendizado frente a algumas experiências vivenciadas. A gratidão é um excelente mecanismo de enfrentamento a situações de riscos e adversidades e fator de proteção da saúde mental, estando relacionada a diminuição de sintomas de transtornos como a ansiedade, depressão e, também, a melhora de sentimentos negativos associados à solidão (17). Salienta-se que os pacientes acompanhados por familiares geralmente referem menos ansiedade, em comparação com aqueles que não são acompanhados por ente queridos.
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Portanto, esse momento de espera dentro do hospital também pode tornar-se uma possibilidade para fortalecer os laços familiares (2) .
Dentre as limitações do estudo, destaca-se que alguns acompanhantes da sala de espera recusaram-se a participar da pesquisa devido a timidez ou dificuldade em expressar suas percepções frente aos sentimentos despertados no espaço hospitalar. Também, devido a situação pandêmica, a quantidade de familiares na sala de espera era reduzida, dificultando encontrar os participantes do estudo. No que tange às contribuições, o estudo incentiva e busca fortalecer a criação de ambiente saudável na sala de espera do centro cirúrgico. Da mesma forma, instiga reflexões dos profissionais da saúde, sobretudo do enfermeiro na coordenação do setor, quanto a necessidade de criar estratégias que promovam segurança, principalmente por meio da comunicação e escuta qualificada.
CONCLUSÃO
Muitos sentimentos podem suscitar nos familiares, enquanto aguardam notícias de seus entes queridos na sala de espera de cirurgia. Alguns sentem-se emocionalmente abalados ao vivenciar momentos de ansiedade, desânimo, tristeza, apreensão, preocupação e angústia diante das experiências passadas e do tempo de espera. Também podem associar o ambiente hospitalar como um lugar infeliz por comportar tantas histórias de vulnerabilidade e fragilidade. No entanto, alguns familiares desvelam esse momento de espera como aprendizado, sendo uma troca de experiência e reflexão entre todos aqueles que aguardam por notícias.
Dessa forma, nota-se a importância da comunicação entre profissionais da saúde e familiares, favorecendo para o alcance da sensação de maior segurança e tranquilidade. Somado a isso, o profissional de saúde, principalmente o enfermeiro como gestor da assistência no centro cirúrgico, poderá compreender as preocupações e necessidades, inserindo novas estratégias promotoras de saúde na sala de espera, tornando aquele momento mais leve e menos estressante, o que contribui para o cuidado integral e humanizado. Logo, a troca de experiências e vivências entre os familiares podem vir a diminuir os inúmeros sentimentos e sensações negativas, com estabelecimento de uma rede de apoio temporária por meio da sensibilidade e empatia, trazendo conforto e uma percepção de tempo reduzida na espera por notícias de seus entes queridos em cirurgia.
Os autores declaram não haver conflitos de interesse.
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